Contornos da guerra em Angola 1
FACTOS mais RELEVANTES
- Junho de 1960: O MPLA (Movimento Popular para a Libertação de Angola) envia uma declaração ao governo de Portugal com vista a negociações para resolver o problema colonial. Este documento levou à prisão de Agostinho Neto e Joaquim Pinto de Andrade.
- Novembro de 1960: Realizaram-se manifestações em Luanda, Lourenço Marques e, também, em Lisboa contra as decisões da ONU em declarar os territórios ultramarinos portugueses parcelas colonizadas; portanto, com direito à autodeterminação e independência.
- Janeiro de 1961: Assalto ao Santa Maria
Quando navegava com turistas no mar das Caraíbas, o paquete Santa Maria foi assaltado por um grupo de portugueses comandado pelo capitão Henrique Galvão. Curiosamente, este militar com serviços prestados na administração Angola, foi o mentor da criação de Nova Lisboa como capital do Império. Segundo as suas declarações, pretendia fazer um desembarque na costa angolana, mas acabou por navegar até ao Brasil onde pediu asilo político.
- Janeiro 1961: Revolta no Cassange
Na sequência de vários protestos por causa dos fracos salários pagos aos trabalhadores, estes entraram em greve por tempo indeterminado, tendo sido violentamente atacados por efectivos da polícia e do Exército. As aldeias da população da zona foram queimadas pelas bombas lançadas por aviões e os tumultos alastraram às fazendas de algodão da Cotonang, culminando com a chacina de milhares de trabalhadores e seus familiares. Os indiciados cabecilhas da rebelião foram presos e fuzilados na região de Gabela. As tropas metropolitanas em serviço em Angola (cerca de 1.700) participaram na repressão aos manifestantes, colaborando com a polícia e tropas locais (cerca de 5.000 efectivos indígenas).
- Fevereiro de 1961: Assalto às prisões de Luanda
Com os poucos efectivos de segurança ocupados na região do Cassange, a agitação foi-se agravando em Luanda onde os revoltosos assaltaram a Casa de Reclusão Militar, tendo morrido um cabo; pretendendo soltar os seus dirigentes presos nas cadeias, os bandidos assaltaram a esquadra de S. Paulo, da Polícia de Segurança Pública, e a repartições do estado. Na refrega, foram mortos sete agentes da polícia que caíram numa cilada dos revoltosos e, em consequência, os colonos armados caçaram e lincharam vários assaltantes. No dia do funeral dos polícias, os desacatos começaram nas ruas e acabaram nos muceques, onde os colonos mataram muitos indígenas.
- 15 de Março de 1961 : Início do terror
Tiveram início os massacres, organizados pela União das Populações de Angola (de Holden Roberto de origem Bakongo) e por militares congoleses, onde foram mortos e mutilados alguns milhares de colonos brancos e empregados negros, nas fazendas do café; especialmente nas zonas dos Dembos, Negage, Úcua, Nambuangongo, Zala, Quitexe, Nova Caipenda, Ambriz, Maquela do Zombo, Madimba, Luvaca, Buela e outras.
Em consequência, mobilizaram-se meios terrestres e aéreos para socorrer os residentes nas zonas ameaçadas, muitos dos quais conseguiram chegar a Luanda com os familiares. A escassez de efectivos militares obrigou a um desmesurado esforço para chegar aos pontos mais necessitados. As autoridades perderam o controlo das vias de comunicação para toda a zona Norte, onde foram destruídas pontes, obstruídas as estradas com derrube de árvores e abertura de valas. Alguns grupos de camionistas que tentaram avançar na direcção dos Dembos, tiveram que regressar por encontrarem as estradas cortadas; outros mais afoitos, caíram em emboscadas e foram mortos a tiros de canhangulo e à catanada. Na cidade organizaram-se milícias para tentar evitar que os bandidos da UPA se aproximassem com a sua sanha monstruosa. Já em Abril, depois das poucas tropas do alferes Meireles terem regressado ao Caxito, os ataques traiçoeiros e selvagens, utilizando catanas e granadas, aproximavam-se de Luanda, passando pelo Úcua, onde foram assassinados mais europeus e os empregados bailundos. Entretanto, a barragem das Mabutas, que fornecia energia a Luanda corria sérios riscos de ser atacada; civis e militares organizaram-se para a sua defesa.
Entretanto, os ataques chegam a outras povoações e fazendas: Bessa Monteiro, Carmona, Pango-Aluquem, Aldeia Viçosa, Lucunga, e Sanza Pombo continuando a perturbar as populações dessas terras.
Ainda em Março e nos meses seguintes de 1961, as tropas especiais (caçadores especiais e pára-quedistas) e alguns pelotões do Exército começaram a reconquistar povoações e fazendas, como Bembe, Maria Teresa, Quicabo, Damba, Madimba, Maquela do Zombo, 31 de Janeiro, Songo, Mucaba, Toto. Foi com alguma surpresa que vieram a constatar que o empenhamento das missões religiosas protestantes teve um grande peso na orgânica e no engajamento de indígenas para a rebelião, já que os diversos documentos encontrados nos locais das missões demonstravam a conivência entre os missionários oriundos de países como os Estados Unidos, Bélgica, Inglaterra e Países nórdicos, bastante próximos dos dirigentes da UPA, cuja sede é no Congo Belga. Numa operação na zona de Cuimba, encontrámos diversas fotografias com elementos da UPA acompanhados de representantes de organizações americanas; e, mais tarde, foram encontradas mais fotos em Madimba e Buela, onde estavam também dirigentes da UPA em festas religiosas e na sede de Leopoldeville.
- Em Abril de 1961: Embarque de tropas
Embarcou em Lisboa o 1º contingente de tropas para Angola no navio NIASSA, cujos militares desfilaram na avenida marginal de Luanda onde foram recebidos com manifestações de intensa alegria e confiança. Poucos dias antes, uma coluna militar foi emboscada na picada de Cólua, onde morreram nove militares, incluindo dois oficiais. Chegados a Luanda, seguiram para o interior Norte, o Batalhão de caçadores 88 foi reocupar a povoação de Damba e o batalhão de caçadores 92 instalou-se em Sanza Pombo; parte das companhias de caçadores continuaram a progredir na direcção da fronteira com o Congo ex-Belga, ocupando Santa Cruz e Maquela do Zombo.
- A 19 de Abril de 1961: Três pelotões de pára-quedistas embarcaram no avião da TAP com destino a Angola, para reforçar o contingente de grupos e equipas com cães de guerra que andavam pelos matos a ajudar na defesa das povoações. Outro grupo de pára-quedistas, que estava destacado em Lourenço Marques, deslocou-se para Angola. Com mais este grupo, outras povoações como o Bungo, Songo, Sanza Pombo, Quitexe melhoraram as condições de defesa contra os ataques dos bandidos da UPA.
- Em 14 de Maio de 1961: Desembarque de tropas
Chegou a Luanda um numeroso contingente militar, composto de unidades de Caçadores, Engenharia e Sapadores. Parte desses militares instalaram-se no quartel do Grafanil, onde permaneceram durante a organização e planeamento das suas primeiras missões. Ao Batalhão de Caçadores 96, comandado pelo Tenente-coronel Maçanita, incluindo um grupo de engenharia comandado pelo Alferes Jardim Gonçalves, coube fazer o reconhecimento e segurança das picadas até à ponte do rio Dange. Sofreram aí os primeiros ataques dos guerrilheiros da UPA, aos quais causaram pesadas baixas. Foi precisamente nesse itinerário que se deram as mais selváticas matanças de fazendeiros portugueses. E os bandidos do Holden Roberto atacavam em grandes grupos munidos de canhangulos e catanas. Para lhes dar o dom da ressurreição, os feiticeiros forneciam mixórdias e drogas que os tornavam imunes às balas dos portugueses. Morriam aos magotes, ficando os corpos espalhados ao longo das povoações como em Cacola, causando um cheiro nauseabundo.
- Em Junho de 1961 – Acções das marinha
A partir da costa norte, o batalhão de caçadores 156 instala-se em S. Salvador do Congo e Cuimba, enquanto forças da marinha desembarcam em Ambrizete e avançam na direcção de Tomboco e Quinzau, que ocupam.
- Em 10 de Julho de 1961: Operação Viriato
O Ten-Coronel Armando Maçanita, comandante do Batalhão de Caçadores 96, dá início à “operação Viriato”, destinada a abrir caminho até Nambuangongo e lá instalar um Batalhão do Exército, com máquinas de engenharia, artilharia, atiradores, telegrafistas e enfermeiros. Seguiram o itinerário de Caxito, Quibaxe, Santa Eulália, Mucondo, Muxaluando e Nambuangongo, onde chegaram na tarde do dia 9 de Agosto; tiveram que reconstruir diversas pontes, incluindo a do rio Dange; durante o percurso, foram atacados pelos bandoleiros da UPA que causaram mortos e feridos.
Com o mesmo objectivo, o Batalhão de Caçadores 114, comandado pelo Tec-coronel Oliveira Rodrigues, seguiu o itinerário por Caxito, ponte do rio Lifune para Quicabo, onde foram severamente atacados pelas hordas inimigas e interromperam a marcha por dificuldades em atravessar a ponte que estava destruída. Sofreram 17 mortos e 46 e feridos, ficando impossibilitados de chegar ao objectivo.
Por outro itinerário mais longo, foi o Esquadrão de Cavalaria 149, comandado pelo Capitão Rui Abrantes, passando por Ambriz, Bela Vista e Zala, chegando a Nambuangongo um dia após o BCaç96, tendo sofrido apenas feridos nos ataques de que foi alvo.
Em todos estes itinerários, as dificuldades eram acrescidas com as pontes destruídas e as picadas obstruídas com árvores de grande porte e valas profundas. As máquinas da engenharia e os sapadores foram fundamentais para que o sucesso destas missões de reocupação.
Nambuangongo era um objectivo determinante para desalojar os bandidos da UPA, que ali tinham instalado o seu quartel-general, e para dar um sinal inequívoco de que as tropas portuguesas jamais dariam tréguas aos terroristas que agiram da forma mais selvagem contra os seus patrões e companheiros de trabalho nas fazendas e roças da região dos Dembos.
Em Luanda, os estrategas militares começaram a ficar preocupados com a lenta progressão das unidades que enfrentavam inesperados obstáculos para chegar ao objectivo. O comando da Força Aérea tentou por em prática os seus planos de reocupação de Nambuangongo e convocou o comandante dos pára-quedistas com vista a fazer um lançamento por via aérea. Quando os chefes do estado-maior do Exército perceberam a manobra, deram o alerta para que mais ninguém interviesse nessa operação senão as unidades que já estavam no terreno. Apesar de progredirem com tremendas dificuldades, era ponto de honra que esse feito – reconquistar Nambuangongo – estava entregue ao Exército. E, quando as notícias vindas da frente (da ponte do rio Lifune e do rio Onzo) onde os Batalhões de Caçadores 96 e 114 sofriam as mais severas baixas, a Força Aérea fez a última tentativa de tomar Nambuangongo, à revelia dos pareceres do estado-maior do Exército, dando ordem de embarque a um grupo de pára-quedistas pronto para realizar o assalto ao quartel-general da UPA. Esse episódio ficou gravado na cabeça dos intervenientes, porque a voz do Tenente-coronel Maçanita fez-se ouvir com ameaças de mandar atirar contra os pára-quedistas que passassem ao alcance das armas dos seus homens. É um facto que muito boa gente quis limpar da história da guerra em Angola.
Continua em:
"Contornos da guerra em Angola 2"
in http://micaias.blogs.sapo.pt/2007/06/
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