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sábado, 24 de janeiro de 2009
Teorias sobre o Colonialismo
por Leopold Senghor e Mateo Madridejos (1979), Editora Salvat; Rio de Janeiro.
Colonialismo, Neocolonialismo e imperialismo: uma classificação teórica
O colonialismo é uma realidade que se impôs ao mundo no derradeiro terço do século XIX, mas é também, e muito especialmente, uma justificação. Essa realidade significava a exploração econômica e dominação política dos paises da Ásia e África por parte das potências européias; era o culminar do expansionismo europeu iniciado no século XV. No entanto, o termo “colonialismo” não tinha até ao início deste século um significado polêmico; englobava todas as doutrinas que pretendiam justificar o domínio da Europa sobre outros povos tecnicamente mais atrasados. Suas principais manifestações ocorreram na Grã-Bretanha e na França, mas a ideologia que o sustentava esteve presente, em maior ou menor grau, em todos os estados europeus; teve também uma repercussão muito específica nos Estados Unidos.
Se o termo “colonização”, desde a Antiguidade, referia-se à ação empreendida por grupos humanos sobre um território afastado do seu lugar de origem, o termo colonialismo aparece numa situação histórica concreta, significando, freqüentemente duma maneira hipócrita, a extraordinária expansão européia da segunda metade do século XIX nas suas diferentes manifestações: emigração, exportação de capitais, exploração de terras e povos colonizados, dominação política, hegemonia cultural, etc.
O colonialismo confunde-se com o imperialismo, em parte como conseqüência das considerações marxistas acerca do fenômeno colonial. Vladimir I. Lênin (1870-1924) levou às últimas conseqüências a doutrina da acumulação de capital elaborada por Karl Marx (1818-1883) e denunciou o imperialismo, enquanto dominação colonialista, como o “estado supremo do capitalismo”, impulsionado pela mesma dinâmica do sistema econômico capitalista para tentar superar ou atenuar as suas contradições internas.
A noção de «império» é de origem romana e definia a suprema autoridade exercida por Roma sobre povos e territórios exteriores, geralmente subjugados mediante o emprego da força. A expansão européia moderna deu vida a novos impérios formados pela metrópole e os territórios dela dependentes. O imperialismo contemporâneo não exige o emprego da força militar para sua constituição; e nem sequer a dominação política direta. Por outro lado, se bem que suas manifestações sejam muito diversas, sua essência é determinada pela exploração econômica do país submetido, quer de seus recursos naturais quer do trabalho de seus habitantes, em benefício da metrópole.
O imperialismo contemporâneo surgiu precisamente na segunda metade do século XIX, quando as forças produtivas, especialmente a indústria, alcançaram um alto nível de desenvolvimento; este impulsionou a procura de novos mercados para os produtos, matérias-primas mais abundantes e baratas e um espaço econômico em que podiam frutificar os capitais excedentes. Tendo em conta as rivalidades existentes entre as grandes potências européias, estas vantagens apenas podiam encontrar-se em países longínquos e atrasados, demasiado débeis, sem consciência nacional e sem meios técnicos adequados para resistir ao assalto da Europa industrializada.
A dominação e exploração colonialista adotaram formas muito diversas, consoante seus principais protagonistas, mas que se podem definir por algumas características essenciais, segundo a síntese de Georges Balandier:
1) Dominação por parte de uma minoria estrangeira, que exerce uma pretensa superioridade racial e cultural sobre uma maioria nativa materialmente inferior.
2) Contato entre duas civilizações muito diferentes: uma, de religião cristã, de economia forte, técnica avançada e ritmo de vida acelerado; a outra, não Cristã, carecendo de técnica, condicionada por uma economia agrária de subsistência e com um ritmo de vida lento.
3) A civilização européia avançada e tecnificada impõe-se em todos os aspectos à cultura autóctone, através de diversas formas de organização política e administrativa.
A um outro nível, o neocolonialismo pode definir-se como um fenômeno histórico caracterizado pelo domínio ou influência que as grandes potências exercem sobre os países descolonizados. Constitui uma manifestação nova de imperialismo, na medida em que um Estado tenta controlar os destinos de outro para assegurar a exploração de seus recursos econômicos e a sua fidelidade diplomática. A primeiras nações neocolonizadas surgiram na América Latina após a independência das colônias espanholas. A «doutrina Monroe» (2 de dezembro de 1823) foi a expressão diplomática do domínio que as grandes companhias americanas vieram a exercer sobre os recursos econômicos deste continente. Conjugando as pressões diplomáticas com as econômicas, quando não recorriam mesmo à intervenção armada, os Estados Unidos conseguiram criar uma verdadeira "dependência colonial", principalmente na área do Mar das Caraíbas.
O Neocolonialismo alcançou dimensões universais após a Segunda Guerra (1939-45), como conseqüência da liquidação dos impérios britânico e francês. Se o mapa anterior à guerra era basicamente dos impérios coloniais, o atual reflete uma situação neocolonial caracterizada por dois traços essenciais:
1) manutenção dos países do Terceiro Mundo como fornecedores de matérias-primas. As nações imperialistas reservam para si as transformações industriais altamente rentáveis.
2) Luta pela hegemonia entre as grandes potências. As pressões econômicas ou a força militar são utilizadas para obter o alinhamento dos paises em vias de desenvolvimento, produtores de matérias-primas, ou os que se encontram colocados em zonas estratégicas. A satelitização política apóia-se nos imperativos econômicos.
A grande expansão européia: justificação e crítica
Durante a primeira metade do século XIX as colônias não tiveram muitos partidários nos governos ou na opinião pública. O sistema mercantilista, que fazia das colônias meras dependências econômicas da metrópole, foi arruinado pela revolução dos Estados Unidos para a independência e pelo processo de emancipação da América Latina. A Grã-Bretanha, muito avançada no processo da Revolução Industrial, não tinha que suportar ainda a concorrência dos outros Estados europeus; considerava assim que a livre-troca, defendida pelo liberalismo econômico manchesteriano, convinha melhor aos seus interesses de supremacia, fundada sobre o domínio dos mares. Os teóricos de economia política, os britânicos Adam Smith (1723-1790) e Jeremy Bentham (1748-1832) e o francês A. Robert Jacques Turgot (1727-1781), declaradamente anticolonialistas, influenciaram decisivamente os políticos ao ponto de Benjamin Disraeli (1804- 1881), então (1852) chanceler do Tesouro britânico, considerar as colônias como «pedras de moinho amarradas ao nosso pescoço». Em França, Napoleão III (1808-1873) tinha completado a conquista de Argélia contra os conselhos de seus economistas e os sentimentos do público. Em 1867, os britânicos evacuaram a Etiópia após um período de ocupação.
No entanto, na segunda metade do século XIX, mais concretamente a partir de 1870, iniciou-se o grande salto da expansão colonialista européia. Em menos de trinta anos, a febre colonial chegou aos confins do globo. A Grã-Bretanha e a França alargaram e consolidaram seus domínios na Ásia, ao mesmo tempo que se lançaram na grande aventura africana. A Alemanha de ato von Bismarck (1815-1898), estimulada por um desenvolvimento econômico sem precedentes, provocou a divisão da África. Os holandeses aperfeiçoaram seus métodos de exploração na Insulíndia (hoje Indonésia), e o rei Leopoldo II (1835-1909), da Bélgica, instalou no Congo (hoje Zaire) um «Estado independente». A partir de 1898, após apoderar-se de Porto Rico, Cuba e Filipinas, o governo dos Estados Unidos desencadeou um verdadeiro furacão imperialista. Na Espanha, as campanhas africanas eram consideradas uma questão de prestígio e ofereciam à opinião pública conservadora a impressão de que a reconquista prosseguia para além do estreito de Gibraltar.
Alguns dados darão a idéia desta extraordinária expansão. Em 1875 os países europeus dominavam apenas 11% do território africano: em 1902 seu domínio estendia-se a 90%. No Norte da África, até 1880, se excetuarmos a Argélia, unicamente no Egito e na Tunísia existiam indícios de controle europeu: no resto do continente apenas no Senegal e na Costa do Ouro (hoje Ghana) se tinham instalado administrações coloniais; as demais regiões eram enclaves comerciais que não podiam considerar-se como colônias no sentido exato, incluindo os territórios portugueses de Angola e Moçambique. Três decênios mais tarde os governos europeus tinham a soberania de quarenta unidades políticas em que haviam repartido o continente africano.
Como se produziu uma mudança tão espetacular? Que impulsos se ocultavam por detrás do arrebatamento colonialista? Numerosas hipóteses foram avançadas para explicar ou justificar este fenômeno, mas a maior parte delas carecem de consistência. Alguns especialistas falaram da pressão demográfica européia, que produziu uma emigração ultramarina de um milhão e meio de pessoas por ano; mas a verdade é que o colonialismo foi elogiado e defendido por paises que não tinham um excedente demográfico. Na França esgrimou-se com o orgulho da sua mission civilisatrice (missão civilizadora); enquanto que na Grã-Bretanha, na boca do escritor Rudyard Kipling (1865-1936), era proclamado que a conquista e exploração das colônias fazia parte da «pesada carga do homem branco». Não decorreria muito tempo sem que os argumentos patrioteiros fossem gritados pela historiografia, antes de produzir-se seu desprestígio final pela ação do pensamento anticolonialista. Freqüentemente, inclusive na atualidade, os países colonialistas pretenderam mascarar seus objetivos, essencialmente mercantis ou estratégicos, insistindo enfaticamente nos benefícios trazidos pelo «pacto colonial» aos países colonizados; a inconsistência destes argumentos não significa, obrigatoriamente, que os efeitos do colonialismo tenham sido exclusivamente negativos.
A grande expansão européia do fim do século produziu-se numa conjuntura econômica de recessão que favorecia o retorno a um protecionismo moderado. O desenvolvimento industrial da França e Alemanha, principalmente, surgia como uma ameaça para os ingleses, que começaram a considerar as colônias como pontos de apoio imprescindíveis. Os homens que então dirigiam os destinos da Europa não se preocupavam certamente de revestir com eufemismos as razões desta expansão. Jules - F. C. Ferry (1832-1893) e Léon Gambetta (1838-1882) em França e Joseph Chamberlain (1836-1914) e Cecil J. Rhodes (1853:1002) na Grã-Bretanha patrocinaram o colonialismo por razões essencialmente econômicas.
A Europa industrializada, impossibilitada de impedir a concorrência entre seus diversos estados, viu-se empurrada para a expansão porque necessitava de produtos alimentares, matérias-primas e novas fontes de energia, mas também de novos mercados para sua indústria; o objetivo era evitar a recessão econômica e a paralisação do trabalho. Em última análise, a expansão colonial teve efeitos políticos benéficos nas metrópoles; atenuou consideravelmente as tensões internas e permitiu criar uma relativa unidade patriótica em torno da perpetuação do domínio sobre outros povos. Apesar de tudo, a submissão da Índia, por exemplo, assegurava o funcionamento em pleno dos teares das fábricas dos Midlands. As melhoras produzidas nas condições de vida dos trabalhadores europeus, o diminuir da mais-valia dos capitais, incitavam a Investir nas colônias onde o trabalho era muito pior remunerado. «Lá aonde estão os interesses deve estar o nosso domínio», dizia Charles W. Dilke (1843-1911), um dos principais teóricos do colonialismo britânico.
Para Jules F. C. Ferry e Joseph Chamberlain, as colônias chamadas tropicais foram mercados essenciais para os excedentes da indústria européia; sem elas a Europa teria tido que defrontar-se com o fantasma da revolução social. Os colonialistas franceses e britânicos argumentam que as colônias, ao proporcionarem matérias-primas e alimentos baratos, impediram os benefícios exorbitantes dos monopólios.
Em suma, consideravam que aquelas não eram só uma solução para superar as rivalidades entre as grandes potências, mas também para resolver a maior parte dos problemas sociais e econômicos de uma Europa industrializada e protecionista.
Junto à crítica realizada pelo marxismo, que considerava a disputa colonial como o último passo necessário para a revolução socialista e o afundamento do sistema capitalista, a escola econômica britânica dirigida por John A. Hobson (1858-1940) pretendeu demonstrar que as colônias tropicais não eram rentáveis para a metrópole. Mas a curiosa análise de Hobson errou a respeito da rentabilidade das colônias e gastos da metrópole, pois considerava que existe sempre um desequilíbrio em prejuízo desta, o que não é exato; no entanto, sustentou acertadamente que o capital excedentário era devido unicamente ao fato dos sistemas sociais e econômicos europeus negarem às massas uma capacidade de consumo suficiente para estimular um maior investimento na indústria nacional.
A defesa do sistema colonial
A defesa do sistema colonial adotou formas muito sutis. Uma delas, talvez a mais divulgada, e ainda utilizada dialeticamente no período culminante da descolonização a seguir à Segunda Guerra Mundial, sentenciava: os povos coloniais devem estar submetidos a uma tutela que os tornasse capazes de se autogovernar. O sistema de mandatos, consagrado pela Sociedade das Nações (organização internacional fundada em 10 de janeiro de 1920) ou o regime de tutela, implantado pelas Nações Unidas (fundada em 26 de junho de 1915), foram suas principais manifestações. Os políticos liberais fizeram sua a tese do filósofo e economista britânico John Stuart Mill (1806-1873), segundo a qual era necessário um período de transição ou de dominação colonial para passar a um estágio de civilização superior. O colonialismo foi considerado como um fenômeno social e biologicamente inevitável; com ele, grupos tecnicamente mais avançados e psicologicamente mais dinâmicos influenciariam outros que permaneciam imóveis no curso da história.
Na Grã-Bretanha, a filosofia imperialista foi levada à prática pelos políticos tories (conservadores), dirigidos por Disraeli, a quem se uniram os «liberais-imperialistas». Numerosos intelectuais sentiram-se fascinados com as doutrinas mais ou menos racistas acerca da superioridade anglo-saxônica e as exigências darwinianas da luta entre as nações. Joseph Chamberlain, que imprimiu ao colonialismo um colorido nacionalista com o objetivo de atrair as massas populares (jingoismo), chegou a proclamar: «Somos uma raça de governantes, predestinados pelas nossas qualidades, bem como pelas nossas virtudes, a expandirmo-nos pelo mundo».
Em 1895, com o gabinete unionista do marquês de Salisbury (1830-1003), em que Chamberlain ocupou o Colonial Office (Ministério das Colônias), a «consciência colonial» atingiu o apogeu.
Na França, a política colonial nunca alcançou o consenso nacional que teve na Inglaterra. O «partido colonial» representava interesses muito diversos, que abarcavam desde os meios econômicos e o exército até ao funcionalismo colonial e as profissões liberais. No início a direita e a extrema-direita opuseram-se a J.-F. C. Ferry, pois este era o típico representante da nova República laica; acusavam-no de «esquecer» a derrota de 1870 às mãos da Alemanha, o que poderia conduzir a nova catástrofe. Quando a direita acabou por impulsionar o fenômeno colonial, a oposição foi dirigida por Georges Clémenceau (1859-1929) e o partido radical. Posteriormente, nas vésperas da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), Jean Jaures (1859-1914) e o partido socialista negaram-se a votar os créditos coloniais, se bem que não exigissem a retirada das colônias; não desejavam destruir o colonialismo mas sim humanizar seus métodos.
Na Alemanha, as idéias colonialistas apoiaram-se na Nachbarschaftsmission (missão de aproximação), fomentada pelos meios missionários católicos e protestantes, que consideravam a exploração e colonização como um meio para abrir o caminho à propagação do Evangelho. No entanto, a política colonial de Bismarck foi impulsionada por motivos comerciais, como é provado pela criação da Deutsche Kolonialve. rein (União Colonial da Alemanha, 1882); bem como pela resposta do Senado de Hamburgo à petição do chanceler sobre a melhor maneira para proteger os comerciantes alemães nas costas da África. Se bem que no início o colonialismo não teve o caráter popular que alcançou na Grã-Bretanha, atingiu as massas populares alemãs através do pangermanismo; posteriormente desembocou no nazismo, como se pode demonstrar com a imposição de um protetorado na Boêmia e Morávia (1939), a divisão da Polônia (1940), etc.
Por outro lado, deve-se aos juristas alemães a teoria dos «territórios sem dono» (Herrenlose Gebiete), sobre os quais o império tinha um direito de ocupação, justificado pelo trabalho prévio de exploradores e comerciantes. Também utilizaram os termos Schutz gebiet (território protegido) e Schutzgz-walt (poder de proteção) em oposição ao território dos estados federados da métropole. No entanto, na prática, o colonialismo alemão não manteve diferenças apreciáveis entre os «protetorados» e as «colônias» no sentido estrito da palavra. Os Estados Unidos, que tinham encontrado na livre-troca o sistema idôneo para o desenvolvimento do seu crescente poderio econômico, vigiavam a expansão colonial e o protecionismo europeus. A «doutrina Monroe», formulada para se opor a qualquer tentativa de «reconquista» da América espanhola pela Europa da Restauração, foi adaptada a estas novas circunstâncias. No Corolario Olney (1895), o governo de Washington declarava que nenhum país europeu podia intervir no continente americano sem o consultar.
Depois da guerra com a Espanha, o Corolario Roosevelt (1904) reforçava os interesses dos Estados Unidos, determinando, de uma forma unilateral, as bases da ordem internacional do continente americano. Mediante a política do Big Stick (grande garrote) este país arrogava-se o direito de empregar a força contra os países latino-americanos que não saneassem suas finanças. O imperialismo americano manifestou-se com força a partir da I Conferência Panamericana (1889) com o domínio sobre Porto Rico, Cuba e Filipinas. Para assegurar o controle sobre o canal interoceânico, o governo americano criou a República do Panamá (1903) em território colombiano; Cuba, Haiti e São Domingos transformaram-se em verdadeiros protetorados (1915-1924), e as Honduras sofreram diversas intervenções. O êxito da Revolução mexicana provocou, inclusive, a intervenção do pacifista presidente Thomas W. Wilson (1856-1924).
A diplomacia do dólar e as intervenções dos marines, no quadro jurídico do panamericanismo, reforçaram as bases da ordem neocolonial neste continente sob o impulso dos presidentes William Mckinley (1843-1901) e Theodore Roosevelt (1858-1919).
Formação dos grandes impérios: do Congresso de Berlim à Primeira Guerra Mundial (período 1884-1914)
Após a revolta dos cipaios e a conseqüente repressão, o Parlamento britânico aprovou o primeiro Indian Act (1858), lei em virtude da qual se dissolvia a Companhia Inglesa das Índias Orientais. Apesar da oposição dos liberais, a rainha Vitória (1819-1901) foi proclamada soberana e imperatriz das Índias (1876); a administração foi centralizada e dirigida a partir de Londres através de um Secretário de Estado. O império britânico da Índia estendeu-se à Birmânia e Malásia; ao mesmo tempo aumentava a emigração para a Austrália e Nova Zelândia, como conseqüência em parte da falta de trabalho. A abertura do canal de Suez (1869) em território egípcio alterou a situação estratégica; os britânicos, obcecados pela segurança e domínio da nova «rota da Índia», intervieram no Egito (1882); o pretexto foi o saneamento da economia do país, na realidade tratava-se de impedir o avanço da revolta do exército nacional dirigido por Arabi Paxá.
A expansão colonial francesa iniciada durante o Segundo Império (1852-1870) no Senegal, Camboja e Nova Caledônia, culminou na III República (4 de setembro é e 1870) e foi realizada por Léon Gambetta, Jules Ferry e Théophile Delcassé (1852-1923). Com a proteção do governo de Paris o explorador P. P. Savorgnan de Brazza (1852-1905) iniciou suas viagens pelo Congo em 1875, pouco depois de o Tratado de Saigão (1862) ter reconhecido a soberania da França sobre a Cochinchina e assentar as bases do protetorado sobre Annam.
A Conferência de Berlim (1885) convocada por Bismarck, então árbitro da Europa, destinou-se a delimitar a repartição da África, defendendo publicamente, como razão para tal, a importância da «missão civilizadora» do homem branco. Na medida em que esta repartição foi originada por motivos econômicos, atraiu primordialmente as potências européias que careciam de colônias e tinham muito pouca influência comercial para assegurar a venda de seus produtos industriais e manufaturados. A conferência de Berlim terminou com a eleição de Leopoldo II da Bélgica como soberano do Congo e o compromisso de submeter os conflitos coloniais à arbitragem internacional.
Apesar destas boas intenções, a concorrência colonialista afetou profundamente as relações internacionais. Os britânicos reforçaram a sua presença na Costa do Ouro, estenderam seu domínio ao Sudão (1898) mediante a expedição de Horatio H. Kitchener (1850-1916) e impuseram uma administração direta sobre o vasto território da atual Nigéria (1899). Por outro lado, a permanência britânica no Egito irritou os franceses e levou-os a desenvolver seu império na África Ocidental. A Alemanha, que controlava a maioria dos credores egípcios, apoiou o domínio britânico no Egito para em troca ter as mãos livres para sua expansão no resto do continente, principalmente no Togo, Camaroes, África Oriental e Sudoeste Africano. A Convenção anglo-germânica de 1800 fixou os limites desta divisão e autorizou o Governo de Londres a estabelecer uma administração direta sobre o Kênia e Uganda, e protetorado sobre o sultanato de Zanzibar.
Após apoderar-se da Tunísia (1881), apesar dos protestos italianos, a França ocupou Tonkin (Indochina) e Madagáscar (1885) e intensificou a conquista da África negra sobre a direção de Jules Ferry, chefe de governo. Para superar a frustração produzida pelo fracasso da sua operação tunisina, os italianos desembarcaram em Masaua África Oriental, e fundaram a colônia de Eritréia; mas o imperador etíope Menelik II (1844-1913) esmagou as tropas italianas em Adua (1896) e conseguiu manter a soberania de seu país até à desforra italiana em 1936. Finalmente, em 1911, após a guerra com a Turquia, a Itália anexou a Tripolitânia e as ilhas gregas do Dodecaneso.
A política de Cecil J. Rhodes, que pretendia estabelecer um «império» do Cabo até ao Cairo por meio da empresa British South Africa Company, provocou confrontos com os franceses e a guerra dos boeres. Uma coluna francesa que pretendia chegar à costa oriental para estabelecer a união de Dakar com Djibuti teve que deter-se em Fachoda (1898) perante o ultimato dos britânicos capitaneados por Kitchener. Este «incidente de Fachoda» originou um confronto franco-britânico até os acordos de 8 de abril de 1904; estes criaram a Entente Cordial, pelo qual a França deixava as mãos livres à Grã-Bretanha no Egito a troco duma absoluta liberdade sua em Marrocos. A França realizou a unificação de seu império africano fazendo convergir no Chade três missões que tinham saído do Norte de África, da África Ocidental e do Congo (1900).
Os planos de Cecil J. Rhodes tropeçaram também na oposição das repúblicas sul-africanas dos boers do Transval e Orange, dominadas por colonos holandeses. As tropas britânicas conseguiram vencer sua resistência após uma guerra particularmente cruel (1889-1092); ambas as repúblicas perderam a independência e foram anexadas à colônia do Cabo pelo Tratado de Vereeniging (1902); mas o germe da revolta manteve-se até à criação da União Sul-Africana (hoje República Sul-Africana), em 1909. Após a independência do Brasil (1822), as rivalidades entre as grandes potências revitalizaram o colonialismo português; sua época culminante tivera lugar no período de 1877-1890 com viagens e expedições de diversos exploradores. Num dado momento o governo de Lisboa acreditou na possibilidade de unir os territórios das costas Este e Oeste de África, mas teve de renunciar a este projeto perante o ultimatum britânico de 1890. Não obstante, diversos acordos diplomáticos e a boa vontade da Grã-Bretanha permitiram aos portugueses consolidar e estender seu domínio em Angola, Guiné e Moçambique, territórios que ocupavam mais de dois milhões de quilômetros quadrados.
Os acordos franco-britânicos suscitaram o receio e a hostilidade dos alemães e criaram o contencioso marroquino, um dos problemas mais típicos da rivalidade colonialista. A independência marroquina, que teria sido possível com a política equilibrada do sultão Muley Hasan (1836-1894), viu-se comprometida seriamente com o acordo de 1904, ao qual aderiram Espanha e Itália. A oposição alemã obrigou a celebrar a Conferência de Algecirad (1906), que colocou Marrocos sob uma espécie de protetorado das gran-des potências; deixava, no entanto, a França com uma influência preponderante que esta reafirmou desembarcando tropas em Casablanca (1907). Mas os alemães acabaram por impor o sistema de «porta aberta», que proibia toda ou qualquer medida de proteção aduaneira. Em 27 de novembro de 1912 foi confiado à Espanha o protetorado de uma zona ao norte (Rif) e de outra ao suI (Tarfaya, Ifni) deste país. O estatuto de Tânger, cidade sob controle internacional, não ficou estabelecido até à Conferência de Paris (1923). A França comprou os interesses alemães mediante a entrega de uma importante zona do seu território congolês à colônia alemã dos Camarões.
Com a partilha de Marrocos ficou concluída a invasão européia da África. Foi uma expansão tipicamente colonialista, visto que a organização administrativa não teve em conta as exigências étnicas, culturais e políticas dos povos colonizados. Quando assim o exigiram os interesses ou estratégicos e as rivalidades entre as grandes potências, paralelos ou meridianos foram utilizados para traçar divisões artificiais; consumiu-se a balcanização política que hoje persiste e que tem sido fonte de inumeráveis conflitos no momento da descolonização.
Mudança social e Nacionalismo nas Sociedades Indígenas
O sistema colonialista, ao desenvolver-se, engendrou as contradições que provocariam sua liquidação. A expansão colonial pôs em contacto duas civilizações com graus de evolução muito diferentes; a longo prazo, inevitavelmente, a mais avançada influenciou a outra, criando os mecanismos sociais e o impulso ideológico que conduziram ao processo de emancipação. A sociedade capitalista não podia alardear seus princípios - liberalismo político e econômico - e evitar simultaneamente que nossos princípios contagiassem os indígenas. Por esta razão, os princípios democráticos não foram aplicados nas colônias, criando-se assim as condições para surgir a revolta contra o domínio colonial.
Como escreveu Xavier Yacono, nas colônias produziu-se a fusão de uma trilogia revolucionária: o europeu, que se expressava através de uma civilização mais avançada, dispondo de técnicas industriais e agrícolas novas; o dinheiro, sob a forma de economia monetária, e o Deus da religião que ensinavam os missionários e praticavam grande parte dos colonos brancos.
A presença européia em Ásia e África, independentemente do juízo moral que mereça a atuação dos colonialistas, provocou uma autêntica revolução nos países colonizados; alterou um equilíbrio social milenário e criou os fundamentos de uma evolução que, inevitavelmente, conduziria à rebelião e autonomia. As sociedades indígenas, algumas das quais nem sequer conheciam a agricultura, foram convulsionadas, sacudidas nos seus alicerces; as necessidades da exploração colonial, com os corolários de uma administração eficaz e um sistema econômico capitalista, fizeram saltar os laços sociais tradicionais.
Já no século passado, Karl Marx considerou que a Grã-Bretanha tinha uma dupla missão na Índia: destrutiva, de aniquilamento da velha sociedade asiática, para poder implantar sobre essas ruínas os alicerces materiais da sociedade ocidental; e construtiva, na medida que consolidava a unidade política da Índia e contribuía para o aparecimento de 'uma elite culta, com qualidades administrativas e impregnada do espírito europeu. Segundo este raciocínio pode chegar-se à conclusão que a violação da identidade indígena foi frutífera, contrariando as teses sustentadas pelo anticolonialismo mais virulento, que afirma que a verdadeira libertação dos povos colonizados não se obterá sem a prévia destruição do último vestígio da herança colonial.
Um dos mais prestigiados historiadores do Terceiro Mundo, Kawalam Panikkar, escreveu: "A dominação européia, forçando os povos asiáticos a resistir e simultaneamente a adaptarem-se às novas idéias, que eram as únicas que podiam ajudá-los a libertarem-se e a reforçá-los, deu-lhes uma vitalidade nova e preparou realmente o advento de um mundo novo [...]. A penetração do tipo imperialista, caracterizada sobretudo pelo investimento de capitais, fez com que a Ásia beneficiasse dos progressos técnicos e conhecimentos científicos [...]. Não era possível manter os asiáticos na ignorância cultural e científica, pois os investimentos só são produtivos se se pode recrutar aí gente qualificada, ou seja, no próprio lugar aonde se fazem, [...]. A difusão dos conhecimentos técnicos entre as populações indígenas conduziria inexoravelmente o capital asiático a roer o monopólio industrial da Europa. Deste modo, na Ásia, o imperialismo, devido à sua característica fundamental, a exportação de capitais trazia consigo "o gérmen da sua destruição".
Assim a Europa exportou não apenas capitais, administradores coloniais e novas técnicas agrícolas e industriais, mas também o espírito científico, o pensamento político e social e, conseqüentemente, a própria ideologia anti-colonialista que fermentaria nas consciências indígenas. Em primeiro lugar, as religiões cristãs que, se bem que estreitamente ligadas ao poder colonial, difundiriam os princípios da fraternidade e igualdade entre os homens independentemente da cor da sua pele; isto, em oposição declarada à superioridade da raça branca em que se apoiava a expansão. Em segundo lugar, os princípios políticos do regime capitalista liberal e os grandes conceitos de «nação», «estado», «soberania», etc., ao introduzir uma aspiração lógica de auto governo foram rapidamente assumido pelas elites indígenas que reclamaram reformas que protegessem seus interesses face aos colonizadores. Políticos ocidentais, como os presidentes americanos James Monroe (1758-1831) e Thomas Wilson (1856-1924), defenderam o direito de todos os povos à autodeterminação, se bem que suas idéias tivessem sido condicionadas aos interesses da economia do seu país, sofrendo um crescimento assombroso.
O marxismo-leninismo, que denunciava o imperialismo como o estágio Supremo do capitalismo, encontrou na Revolução Russa (1917) e posteriormente na III Internacional (fundada em 1919), um magnífico trampolim para poder penetrar nas sociedades Indígenas; aí propagandeava a boa notícia da emancipação e a necessidade da luta contra a opressão colonial, incitando os povos asiáticos e africanos à insurreição armada, se necessário, para conquistar seus objetivos. Após a tomada do poder pelos bolcheviques em 1917, os principais líderes dos movimentos anticolonialistas dirigiram-se a Moscou, nova Meca, que lhes prometia a salvação sob a forma de independência política e planificação econômica para recuperar seu atraso em relação ao Ocidente.
As conseqüências da Primeira Guerra Mundial
A guerra de 1914 a 1918 trouxe para a Europa uma grande catástrofe demográfica e econômica, debilitou consideravelmente as potências colonialistas e desgastou seu prestígio; os Estados Unidos, teoricamente anticolonialistas, assumiram o papel de dirigente da economia mundial e pressionaram para que fossem abolidas as barreiras protecionistas criadas pelos impérios coloniais.
Esta grande guerra foi, acima de tudo, um conflito imperialista originado pelos antagonismos e a concorrência industrial e comercial entre por um lado a Grã-Bretanha e a França e por outro a Alemanha. Os alemães, convertidos à ideologia da expansão ultramarina a fim de obterem matérias-primas baratas e novos mercados para os produtos da sua indústria em rápida expansão, ameaçavam o poderio de britânicos; antes, tinham-na obtido em conseqüência do seu avanço na industrialização e de sua supremacia marítima.
Os antagonismos imperialistas e nacionalistas, habilmente explorados pelas classes dirigentes européias, serviram para atenuar as tensões internas e desmobilizar o proletariado revolucionário; a maioria dos socialistas, como Jaures em França, acabaram incorporando-se na «União Sagrada», criada para defender os interesses da pátria ameaçada... A expansão imperialista, ao transportar para as colônias as formas agudas de exploração, travou os impulsos revolucionários na Europa, o que explica parcialmente que a revolução estalasse na Rússia, não participante na divisão colonial.
A guerra não só debilitou a Europa, mas também mostrou claramente a grande contradição do domínio colonial: qualquer passo para a autonomia ameaçava os alicerces do império. O apoio que as colônias deram às metrópoles e a mobilização e reivindicações que começaram a manifestar as elites indígenas minavam a superioridade européia. Por esta razão, todo o processo descolonizador pode esquematizar-se nos seguintes termos: as reformas nas colônias tinham como obstáculo principal medo destes perderem a soberania, o que prejudicava os interesses econômicos representados pelos colonos e administradores; mas essa impossibilidade de levar a cabo reformas importantes agudizou as contradições e acabou por constituir uma das principais armas na luta dos colonizados pela sua emancipação. A expansão européia terminou com a guerra. A divisão tinha acabado, o mundo estava definitivamente partilhado e submetido na sua maior parte ao domínio de duas grandes potências: o império britânico, com 30 milhões de quilômetros quadrados e 400 milhões de habitantes; o império francês, com 10 milhões de quilômetros quadrados e 48 milhões de habitantes. A partir de 1919 entram na liça as forças sociais, políticas e econômicas chamadas a mudar a face do mundo, mas que demoraram três decênios para conseguirem alguns dos seus princípios objetivos.
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