terça-feira, 21 de julho de 2009

A Descolonização Portuguesa Em Perspectiva Comparada Manuel Valentim Alexandre investigador Principal, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de

A Descolonização Portuguesa Em Perspectiva Comparada
Manuel Valentim Alexandre investigador Principal, Instituto de Ciências Sociais,
Universidade de Lisboa


A descolonização portuguesa tem sido quase exclusivamente estudada numa perspectiva de tempo curto, privilegiando o período que vai da revolução de 25 de Abril de 1974 até à data da proclamação da independência de Angola, a 11 de Novembro dano seguinte. É bem claro, no entanto, que ela faz parte de um movimento mais vasto, de ordem global, iniciado logo após a
2.ª Guerra Mundial e, nalguns casos, com raízes mais longínquas– e que só nesse contexto pode ser plenamente analisada, nos seus pontos comuns e nas suas especificidades. Trata-se de um vasto programa, que supõe um trabalho de pesquisa em grande parte ainda por fazer. No presente texto, de carácter meramente introdutório, alinham-se apenas algumas ideias gerais, de ordem comparativa, na esperança de que possam servir de pontos de referência para uma reflexão sobre o caso português.

Os Impérios Coloniais Europeus
após a 1.ª Guerra Mundial

Por vários aspectos, o período entre os dois conflitos mundiais pode considerar-se como o ponto culminante do sistema colonial europeu. É por essa altura que ele atinge a sua máxima expressão territorial, após a ocupação efectiva das possessões africanas, concluída durante a Grande Guerra, no essencial, e a partilha das regiões do império turco do Médio Oriente pela Inglaterra e a França, determinada em 1919 pelo Tratado de Versalhes (embora sob a forma de mandatos). Para além da sua superioridade militar, que as campanhas de ocupação tinham tornado patente, a Europa prevalecia-se da força da sua economia e sobretudo do brilho da sua civilização, que – a seus olhos –sobrepujaria todas as outras. Segundo muitas das formulações doutrinárias da época, a colonização encontraria a sua justificação e a sua legitimação tanto no aproveitamento dos recursos necessários ao progresso da humanidade como na transmissão às “raças atrasadas” ou mesmo “primitivas” dos valores culturais e técnicos da “raça branca”1. Nestes termos, o domínio imperial era visto como um facto histórico natural e inquestionável, destinado a perdurar por longo tempo, com o consenso dos próprios colonizados, incapazes de se governarem a si mesmos. Essa perspectiva parecia adequar-se particularmente às realidades vividas nas possessões africanas, onde um número restrito de europeus controlava então milhões de habitantes, sem sobressaltos de maior, com recursos limitados e forças armadas muito reduzidas.
A teoria de Ronald Robinson – com a sua ênfase no uso pelas potências imperiais de grupos locais colaborantes como intermediários, sendo esse o principal mecanismo de controle sobre
o mundo não europeu2 – encontra aqui o seu terreno e a sua época de eleição (o que não exclui a existência de formas de resistência a esse mesmo controle).
No entanto, ainda nesta sua fase de apogeu, é possível discernir sinais de desajustamento na evolução do sistema colonial, com efeitos a longo prazo. Uma primeira brecha, embora ténue, resulta do peso que depois da 1.ª Guerra Mundial ganhou o princípio da autodeterminação
dos povos – peso por grande parte derivado das posições assumidas pelo presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, tendo em vista a solução das reivindicações das várias potências europeias no pós-guerra. Continua....

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