sábado, 29 de outubro de 2011

Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes, Governador de Angola 1861-1862 e o "incidente Birnie"



Entre os homens que por qualidades de mando avultam nas gerações passadas, encontra-se um, cujo nome, pelo seu desprendimento de vaidades e pompas, é do vulgo pouco conhecido, o general e ministro de estado Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes.
A sua vida, desde a adolescência é de uma larga acção, foi bastante preenchida; como soldado, como engenheiro, governador de provincia ou ministro, distingui-se sempre pelo seu valor pessoal, decisão energica, sábia administração e incontestável rectidão de carácter.
O seu governo da provincia de Angola, de 1861 a 1862, é uma página brilhante. Encontrando a provincia na mais desastrosa situação,conseguiu, em tão curto prazo, transforma-la militar e civilmente, corrigindo abusos, reorganizando as forças, melhorando as povoações, animando a agricultura e o comercio, e impondo o respeito ao gentio (aquele que professa a religião pagã) e aos estrangeiros, fazendo inteira justiça.
Um facto notável do seu governo, foi o incidente Birnie, basta para demonstrar a energia desassombrada deste homem e quanto dessa qualidade importa reter aos que dispõem do superior mando.
Navegava por aqueles mares uma esquadra Norte Americana, que foi aportar à nossa costa ocidental de África, onde o comissário americano, Eduardo Birnie cometeu um crime punível pelo direito comum, sendo preso e entregue à autoridade judicial de Luanda.
O Almirante ao saber da prisão do comissário, reclamou-o energicamente ao governador, o qual respondeu com uma formal recusa da sua entrega.
Então o almirante retorquiu a ameaça de que libertaria Birnie pela força, e que, sendo necessário, bombardearia a cidade.
Sebastião de Calheiros não se atemorizou, dispôs tudo para a recepção do terrível hospede, e mandou-lhe repetir que por forma alguma entregaria Birnie, pois que este tinha sido justamente preso, e, quanto à violência podia empregar a que quisesse, mas que à primeira bala disparada contra a cidade mandava enforcar o comissário na praia em frente da esquadra.
O almirante em vista da destemida resposta de Sebastião de Calheiros e dos preparativos de defesa fez-se ao largo, sendo Birnie pouco depois julgado e segundo as nossas leis condenado.
Soube o governo dos Estados Unidos justamente apreciar este enérgico acto do governador de Angola, e mandou a corveta de guerra Mohican dar-lhe uma satisfação, oferecendo-lhe um festivo banquete a bordo.
O comandante da esquadra francesa, naquelas paragens por ocasião do incidente, felicitou o corajoso governador pela firmeza com que soube manter os direitos do seu pais, manifestando-lhe o alto apreço e grande estima que o seu carácter e o seu valor lhe mereciam, e que iriam reflectir-se na nação tão dignamente ali por ele representada.

Excerto do Relatório Por Angola: Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes, governador geral. 1861-1862


Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes, governador geral. 1861-1862
"...  E este o estado em que ficou a colonia a meu cargo no fim do anno, a que este relatorio se refere. Se não ha grandes resultados obtidos, alguma cousa todavia me parece poder notar-se com vantagem em relação ao que por mim foi encontrado, e sobretudo mais alguma cousa ha a esperar da semente qne lancei á terra, e que é de crer que germine e fructifique.... 
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     Poderia concluir aqui o meu trabalho; parece-me porém conveniente levar ao conhecimento de Sua Magestade o meu juizo sobre o futuro da provincia, assim como as minhas vistas sobre o modo de promover o seu desenvolvimento e prosperidade.

Os dominios portuguezes d'esta parte da África comprehendem, como já demonstrei, uma immensa extensão de territorio, que pôde adiantar-se extraordinariamente para o interior. Esse territorio é cortado de rios, que correm para a costa occidental, e os seus valles são notavelmente ferteis, assim como as entranhas da terra se mostram ricas de metaes. Podem portanto esses dominios offerecer valiosos recursos, e a metropole deve aproveita-los. É essa com effeito uma lhes e irrefutavel. O que resta é determinar os meios para se alcançar o fim. 

Este paiz jaz sob o sol dos tropicos, e é habitado por pretos. Estes, se não são em geral uma raça inferior, são-no porventura em especial, e os de Angola são talvez da especialidade; mas quando o não sejam, acham-se em completo estado de rudeza.

Estes pretos conservam-se quasi completamente no estado da natureza, a preta é como escrava e obrigada aos trabalhos mais rudes, não conhecem as necessidades da civilisação, e as naturaes, n'esta zona, em que são muilo mais limitadas, e onde a terra produz, quasi espontaneamente, o sufficiente em relação á sua população, póde dizer-se que as satisfazem sem trabalho. Por outro lado o calor tropical, se não mesmo a sua propria natureza, convida os pretos á indolencia e ao ocio. E portanto muito preguiçosa toda essa população indigena, e muito diminuta relativamente á immensa extensão de territorio.

    Como pois aproveitar os recursos d'esta terra, se os seus habitantes não offerecem os precisos meios de trabalho? Dir-se-ha que importando no paiz a raça branca com a sua intelligencia, energia, amor e habitos de trabalhar. Mas os valles de Angola, onde se produzem os generos coloniaes, não permiltem o trabalho aos brancos; e se com o devido resguardo ahi poderiam viver e fazer cultivar a terra dirigindo o trabalho dos pretos, falta-lhes a precisa acção sobre elles pela quasi completa isenção do trabalho forçado. E nos pontos elevados da provincia, onde, dizem uns, e suppõem outros, que o branco vive bem, ou não se produzem os generos coloniaes, ou ficam a tão grande distancia que o preço do transporte torna sem valor a cultura, resta é determinar os meios para se alcançar o fim. 
    Quando porém com mais ou menos sacrificios a colonisação branca fosse possivel, d'onde havia de vir essa colonisação? O reino e as ilhas adjacentes, que gente poderão dar annualmente para colonisar a nossa África? Não é bem sabida a escassez de braços, que a emigração para o Brazil ahi tem produzido? Ainda que se dirigisse para Angola toda essa emigração (o que não devia tentar-se, porque uma parte d'ella será mais util á metropole no Brazil, do que em Africa), não era isso um grão de areia lançado annualmente n'esse vasto deserto? E a emigração da Europa, emquanto estiverem ermos os sertões da America do norte e da Australia meridional, tão saudaveis como os valles europeus, e os sertões do Brazil mais saudaveis que os de Angola, poderemos nós ter a pretensão de a chamar aqui?
    Dir-se-ha que não se tem ainda explorado este paiz á luz da sciencia ou mesmo da inteligencia, que ainda se não fizeram esforços de colonisação e aclimatação, de modo que possa deduzir-se, que lhes da impossibilidade do trabalho dos brancos está demonstrada. Suppondo, mas não concedendo que assim seja, estamos nós em circumstancias de arriscar gente e dinheiro em experiencias, que pelos argumentos àpriori não devem dar bom resultado ? Deveremos despovoar o sul do reino, o Minho e os Açores para correr o risco de inutilisar colonos nos nossos sertões africanos?
Mal guiadas vão pois, quanto a mim, as idéas d'aquelles que pensam no grande impulso agricola que dizem poder e dever dar-se á provincia de Angola, enviando meios e gente do reino. Eu não posso ter illusões a esse respeito, em vista do conhecimento que pessoalmente adquiri d'esta provincia, e da de Cabo Verde, percorrendo a costa e o interior.

A agricultura dos brancos em Angola, em generos coloniaes, póde dizer-se impossivel sem o trabalho forçado; e mesmo assim nunca será tão productiva como em S. Thomé, na Havana, no Brazil e Estados Unidos, pela facilidade que têem os pretos de subtrahir-se á acção dos brancos, fugindo para onde não é possivel ir busca-los, o que não succede nos paizes citados.
Trabalho livre dos pretos, prestado aos brancos pela remuneração, que o producto da agricultura dos tropicos permite dar, é um sonho, ao menos por ora. Os pretos que, por excepção, forem laboriosos, trabalham para si, que de pouco carecem, e não para os agricultores brancos; cultivam a sua propriedade tão facil de obter, e que lhe dá mais lucro com relação ás suas necessidades, que o salario do lavrador, do qual não supportam a sujeição, incómmoda aos seus habitos e desnecessaria ás suas limitadas aspirações; quanto aos preguiçosos, podarão agricultor dar-lhes salario que os convide?
Como os precedentes do governo de Sua Magestade são todos contrarios ao trabalho forçado nas colonias africanas, seria ocioso fazer indicações em tal sentido, e pelo mesmo motivo cumpre dizer, que se não deve ter illusões a respeito do seu grande desenvolvimento agricola.
Partindo d'estas bases, e sendo taes as minhas convicções, é claro que sou de opinião, que as vistas do governo se devem dirigir particularmente sobre a exploração commercial d'este paiz, e sobre os meios de educar e aportuguezar a raça preta, pois que será com ella e por ella, que poderá levar, se é possivel, n'um futuro mais ou menos remoto, este paiz ao gremio da civilisação. Não digo que se despreze a agricultura, onde ella seja verdadeiramente util e productiva, e a distancia que possa facilmente proteger-se, e receber o impulso da intelligencia e esforço dos europeus que venham estabelecer-se n'esta provincia. Para isso bastará, durante muitos annos, ulilisar os terrenos proximos da costa e o dos valles dos rios, que são os mais promettedores e os que merecem consideração.
É de primeira necessidade tomar os nossos limites legaes n'esta colonia, e occuparmos devidamente a costa entre 5° e 12', e 18° de latitude, de modo que passe pelas nossas alfandegas todo o commercio de importação e exportação que n'ellas se faça, e assim cessará o trafico entre o Ambriz e Molembo, onde estou convencido que não acaba senão com essa occupação pela nossa parte. Devemos estabelecer communicações para o interior pelos rios como o Cunene, que constituirá ao sul a nossa fronteira, não convindo estender a occupação pela costa alem da sua foz por um paiz deserto e esteril; e tambem seguir pelo Zaire, que constituirá ao norte uma grande linha commercial, garantida pela occupação da cosla até 5° e 12' de latitude meridional (1).

1 Em 2 de dezembro de 1861 foram pedidos ao governo dois botes de ferro, para com eltes se proceder ao reconhecimento do rio Lucatla. Estes botes acham-se hoje em Loanda. O Lucatla (em grande desenvolvimento desde as terras da Ginga até á sua confluencia em Massangano com o rio Quanza; e poderá tatvez tornar-se uma grande via industrial, aindaque a navegação aio se verifique, senão passando os generos por terra em curtas distancias do plano superior para o plano inferior das cachoeiras ou obstaculos; o que é facil, mandando estabelecer nos pontos adequados povoações, que se prestarão a esse trabatho, mediante diminuto salario.
Em seguida cumpre chamar os pretos ás nossas relações e sujeição pelo bom trato, sem vexames, ou exigencias pecuniarias, como signal de vassallagem. Sejam as alfandegas a fonte de receita da provincia. Se pois nos não temos gente (nem a teriam outras nações) para colonisar a provincia e explora-la agricolamente desde já; e so pelo systema indicado da occupação, o commercio viria espontaneamente aos nossos estabelecimentos, não lendo outra parte onde comprar e vender; segue-se que as occupações no interior, pelo centro, não deverão estender-se alem de certos limites, porque o contrario será nocivo e perigoso, ao passo que é desnecessario. Temos uma linha de occupação no interior, já em verdade bastante avançada, desde S. Salvador do Congo, ao pé do Zaire, até ao Humbe sobre o Cunene, interrompida, comojámostrei, por grande extensão de territorio, não guarnecido, entre o districto do Golungo Alto e o do Ambriz ao norte, entre o mesmo districto e o de Benguella no centro, e entre este ultimo e o de Mossamedes ao sul. Conservar essa linha, senão mesmo reduzi-la a limites convenientes, e em qualquer dos casos fortifica-la e guarnece-la, estabelecendo n'ella colonias militares, e collocar n'estas Iodos os degradados, que podérem e deverem ser dispensados do serviço militar, entendo ser uma medida de grande alcance para o futuro d'esta provincia. Não se deve exceder esta linha: contentemo-nos com a zona comprehendida entra ella e a costa, sendo bem occupada e defendida, e com os interesses do commercio, que o gentio do interior não pôde deixar de entreter comnosco.

Já demonstrei que as occupações do interior de Mossamedes não tem valor. So a do Humbe o poderá vir a ter mui remotamente, quando subirmos, como devemos, pelo valle do Cunene, em cuja margem assenta o posto que occupâmos. N'este ponto julgo devermos tomar por limite a serra da Chella, cuja uba occidental, e o valle de Capangombe e Bumbo, offerecerão, durante muilo tempo, espaçoso campo á actividade dos colonos e emprehendedores.

    Com a exposta ordem de idéas va e de accordo a fortificação que ordenei em Maiange, centro da linha interior; está em harmonia com ellasacolonisação que procuro estabelecer em Caconda; e n'essas vistas tenciono, logo que se me offereça occasião, abrir as communicaçoes para o Bcmbe por Encoge, ligando assim os concelbos populosos-e bem avassallados dos valles do Quanza, Bengo e Dande com o norte da provincia, assim como entendo que, logoque seja possivel, se deve trabalhar no mesmo sentido, correndo de Pungo Andongo para o sul até Caconda, através do territorio, nãooccupado, do Libolo, Bailando e Bibé, e d'abi até os limites do sul do lado do Humbe.
   Devo comtudo observar que os pontos occupados n'essa linha, e as colonias militares ali estabelecidas, deverão ler por fim tomar pontos estrategicos para segurar a dominação, crear estancias para o commercio do sertão interior, e estabelecer centros de população branca, ou mesmo preta educada ao contacto dos brancos, como fóco de civilisação, sem que deva pensar-se, quanto a mim, em d'ahi tirar resultado para agricultura de generos coloniaes, a não ser em futuro muito distante.
   Occupada assim a provincia, tomadas por este modo n'esse immenso tracto de terreno as couve
mo n Ies linhas delimite, com sujeição e dominio effectivo, conviria actuar sobre a sua população para educa-la. Como porém realisar tão ardua empreza?
Já acima disse, e é obvio, que só o contacto dos brancos, e as suas relações podem educar os pretos, que convem chamar e afagar, fazendo-lhes ver que o nosso dominio não é pesado, para que elles o não evitem. É mister que o preto conheça que a auctoridade do funccionario branco é mais suave e mais benefica que a do sóba preto.
   Cumpre portanto mudar de systema, acabar com as camaras, as juntas de parochia, as com missões municipaes, os juizes ordinarios, e os subdelegados, que não têem sido no interior senão fontes perennes de vexames para os prelos. Eu mesmo observei em todo o sertão, que essas administrações e justiças de brancos desempenhadas pelos pretos, como são e não podem em geral deixar de ser, eram absolutamente odiosas tanto aos brancos como aos mesmos pretos. (Doe. n.° 25.)
É preciso dar uma boa posição aos chefes, e empregar os meios para se lhes fazer effectiva toda a responsabilidade dos seus actos, e, concentrar n'elles toda a auctoridade; podendo assim esperar-se os effeitos da acção benefica e mando que se lhes confia.
O chefe para a administração, e o padre para a instrucção e educação intellectual, moral e religiosa, eis-aqui lodo o funccionalismo que convem conservar n'esse sertão.
O chefe será juiz de paz e ordinario, será administrador e commandante militar; mas não será collector, pois entendo que essa entidade deve ser desconhecida no sertão, onde não convem pedir ao preto um real de imposto. Toda a população da provincia pagará bem o seu tributo na alfandega, concorrendo assim, mais ou menos directamente, para a producção ou para o consumo.
    Exceptuando os concelhos, onde os costumes dos pretos tenham já sido muito alterados pelo trato com os brancos, e raros são elles n'esta provincia, é minha opinião que a instituição dos sobas deve ser conservada, pois como auctoridade tradicional, é, e será sempre, a mais respeitada de todas.
   Que um grande concelho composto de muitos sobas seja dividido em divisões, e que o commandante da divisão seja o chefe dos sobas da sua circumscripção, pôde por excepção admiltir-se; mas que os prelos se entendam directamente com os sobas. Se houver alguns brancos estabelecidos nos sobados, ou gente de cor e mesmo pretos que se possam dizer educados e civilisados, esses que dependam directamente do chefe, ou do commandante da divisão, quando o haja, e não do soba; e so convirá dispensar o valor d'esta instituição quando o numero d'aquelles se tornar grande, e a sua força moral e influencia dominar a dos sobas.
    Julgo dever lembrar aqui que 5 Inglaterra e a Hollanda, habeis nações coloniaes, lêem sempre seguido com proveito o systema de utilisar, quanto possivel, as instituições dos indigenas, como já remotamente outros povos dominadores ensinaram e praticaram cm suas vastas conquistas.
   Não posso tambem dispensar-me de apresentar uma idéa que considero capital a respeito do assumpto de que se trata. Se é conveniente aceitar c aproveitar a instituição e auctoridade dos sobas, é tambem preciso educa-los e aos seus macotas; indispensavel aportugucza-los, c, como um poderoso meio de o conseguir, devemos ensinar-lhes a ler, escrever e contar em portuguez. Saibam portuguez, quanto possivel, os grandes de um sobado, que os pequenos o irão aprendendo. Se Portugal não pôde quasi com certeza crear aqui uma nação da sua raça, como creou do outro lado do Atlantico, ao menos eduque um povo que falle a sua lingua, e tenha mais ou menos a sua religião e costumes, a fim de lançar mais este novo cimento na causa da civilisação do mundo, e de tirar depois mais partido das suas relações e esforços humanitarios.
Demos pois aos pretos boas auctoridades na pessoa dos chefes, bons mestres e directores na pessoa dos padres, não imponhâmos aos sobas senão a obrigação de dar soldados para a força militar, e de ensinar a ler, escrever e contar a seus filhos,  aos de seus parentes e macotas; e deixemos que o tempo, a religião e a instrucção façam o seu dever.
Do que fica exposto, vê o governo de Sua Magestade que eu voto pela maior simplificação possivel da administração no interior da provincia, e nem podia deixar de assim pensar em vista do estado intellectual e moral da sua população. E um povo na infancia, portanto deve dar-se-lhe, mais ou menos, uma organisação patriarcha. O regimen municipal e as justiças ordinarias poderão apenas convir em dois ou tres pontos do litoral; e ainda ahi a auctoridade administrativa local deve presidir á municipalidade. Nem estão menos em desaccordo com o estado selvagem da provincia as franquezas eleitoraes. que lhe foram concedidas, dando em resultado, por um lado a decepção e a burla, por outro a desmoralisação.
E preciso pois retrogradar; não tenho duvida em affirma-lo ao governo de Sua Magestade, e sou insuspeilo, porque desde muilo moço combati pela causa das instituições que nos regem. Não posso convencer-me de que aos povos selvagens dos serlões de Africa se devam applicar as garantias e conceder as immunidades constitucionaes implantadas em Portugal em 1834, nem tambem creio que a pouca e vacillante população europea, que habita Angola, e a diminuta população indigena, que se considera civilisada, em Loanda ou Benguella, aprecie essas instituições e saiba fazer uso d'ellas.
   Julgo necessario fazer-se uma grande reforma politica e economica em Angola. Feita ella, ficarão lançados os alicerces da prosperidade da colonia, e cessarão os sacrificios por parte da metropole, ou serão de pequena importancia os que haja de fazer para realisa-la.
   Essa grande reforma deverá ser acompanhada de differentes providencias, entre as quaes passarei a enumerar as seguintes: 

1.a, a exploração scientifica da provincia, melhorando-a, no que for possivel, quanto á aclimação dos brancos nos pontos mais proprios para o estabelecimento d'estes, e com relação aos recursos mineralogicos; 

2.° uma lei que facilite inteiramente a acquisição de terras, dando, com as menores formalidades que for possivel, ao cultivador a propriedade do baldio que tiver cultivado, e ao pesquisador a da mina que houver descoberto e pozer em exploração; 

3.° providencias tendentes a facilitar a emigração espontanea do reino e ilhas, apresentando-a com as vantagens que offerece a do Brazil, e proporcionando tambem os meios á reemigração do imperio, aos que ali se acharem descontentes, adiantando a passagem nos navios de commercio, e dando-a gratuitamente nos do estado; 

4.° uma lei de melhoramento na situação actual dos funccionarios, assegurando-lhes também um futuro, sem o que a administração central não tem força no mando, nem podem aproveitar as suas mais justas e necessarias disposições, nem tão pouco se pôde esperar que o funccionario se a ÍTei coe á colo n ia, e n'el Ia se estabeleça, como convem aos interesses do paiz1

5.° uma disposição que facilite a introducção, o derramamento, a creacão e a conservação de animaes que auxiliem as differentes industrias; 

6.° a creação de um banco em Loanda, e do estabelecimento de navegação a vapor particular á costa, medida de grande auxilio geral, mas especialmente para o commercio; 

7.° a construcção de algumas estradas auxiliares das communicações fluviaes, e grande desenvolvimento de obras publicas, boje largamente possivel com o producto do imposto de 3 por cento ad valorem;  

8.° a educação e instrucção da população, attendendo a que na provincia não é possivel grande applicação ás sciencias, nem aos europeus nem mesmo aos indigenas, pois apenas convirá organisar aqui um bom lyceu, alem de algum collegio para a infancia; e os padres serão mais bem educados nos seminarios de Portugal, ficarão mais portuguezes, e continuarão a sê-lo voltando ao seu paiz, e aprenderão melhor a lingua, que depois devem aqui ensinar; 

9.° a troca de recrutamento de pretos entre Angola, S. Thomé, Cabo Verde, e mesmo Moçambique, unico meio de ter bons soldados pretos de 1.a linha n'esta provincia,,visto a propensão dos nativos para a deserção, a facilidade de a realisar, e a difficuldade de a punir, e porque, resistindo os brancos difficilmente á vida de soldado, seria esta a maneira de dispensar mais ou menos completamente o seu serviço militar, empregando-os mais utilmente, tendo tambem em attenção o preciso augmento de força de 1.a linha em harmonia com o augmento do numero dos pontos occupados na provincia, e ouIras circumstancias que o reclamam; 

10.° uma organisação geral dos diferentes serviços publicos tendente á sua maior simplificação possivel, de maneira que se empregue o menor numero de individuos, pela extrema dificuldade de os obter idoneos, a cujo respeito não me dispenso de indicar a suppressão das delegações de fazenda, substituindo-lhe o systema que vigora em Cabo Verde;

11.º, uma providencia combinada com differentes nações a bem da causa da humanidade, se este sentimento é real e unanime, prohibindo a venda de armas e polvora, objectos que alimentam o trafico da escravatura, exclusivamente fornecidos pelos inglezes e americanos, com o que ficará segura a obediencia dos prelos avassallados, e inoffensivo o gentio diante da nossa força armada; 

12.°, especialmente uma reforma no serviço judicial, de modo que os empregados do juizo de paz sejam muito interessados nas conciliações, e que n'este juizo se terminem a maxima parto dos pleitos, deixando aos sóbas decidir as questões entre filhos (vassallos) até certa alçada, embora com a conservação de prejuizos, que só o tempo e a educação poderão acabar; e deixar aos chefes, como juizes ordinarios que são na maxima parte dos concelhos(1), o decidir a maior parte das causas crimes, de modo que ás instancias superiores não subam a infinidade de processos, que hoje sobem, com grave prejuizo publico, e borrorosos vexames e injustiça para as partes; 

(1)  A antiga instituição do julgamento summario em tribunal composto pelo chefe, como juiz, do escrivao e do tendala (interprete) com voto consultivo, compreeendia a do juizo de paz, era e é adequada áquelle povo e estima por elle ; offerece as precisas garantias de justica ao paiz que tanto a carece, ordem e paz a administracao e forca ao governo.

13.°, o estabelecimento de uma estação naval a vapor, que possa auxiliar a administração nas suas relações entre os postos da costa, e que de accordo com as auctoridades dos differentes pontos responda, perante o paiz, pela completa execução das leis contra ò trafico, que comtudo pôde dizer-se acabado no territorio avassallado, salvo alguma muito rara transgressão, e que assim se poderia dizer cxtincto em toda a costa, desde 5° e 12' até 18°, cessando a humilhação que muitas vezes soffremos dos estrangeiros; estação naval, que bem organisada e bem dirigida não causaria muito maior despeza que essa abi sustentada inutilmente, porque o trafico so se faz ao norte do Ambriz,e geralmente em navios com bandeira que os cruzeiros não podem deixar de respeitar; 

14.°, a melhor organisação do serviço de saude, de sorte que abundem na colonia os facultativos e os pbarmaceuticos, animando assim os brancos a procurar aqui fortuna, certos de que se o clima não é salubre, Ibes não faltarão os recursos para se tratarem em suas molestias; 

15.°, a adopção de uma pauta geral das alfandegas, apropriada á provincia, desprendendo-se o governo de principios que, por incontestáveis que sejam na sua applicação á Europa civilisada,  são da mais duvidosa vantagem, se não de reconhecida inapplicação, na Africa selvagem; 
16.°, e finalmente essa grande reforma deve ser acompanhada, como medida da mais subida transcendencia, da fixação da boa intelligencia das leis e tratados sobre o transporte de escravos e libertos por mar entre os portos da provincia, e entre ella e a de S. Thome, a fim de que não subsista a interpretação erronea que se deu ao n.° 4.* do artigo 5.° do tratado de 3 de julho de 1842, com grave prejuizo publico, e particular das duas colonias.
Outras providencias de menor importancia poderia lembrar, que não apresentarei agora para não tornar este relatorio demasiadamente extenso, convindo apenas especialisar o estabelecimento de alguns pontos fortificados na costa, segundo o indicar um bem entendido systema de defe/a, habilitar a provincia com o material de guerra preciso e apropriado, que hoje não possue, e constituir devidamente a auctoridade elevando-a e centralisando a sua acção, porque a auctoridade-é a maior força productora em Africa. O governo da metropole deve empregar o maior cuidado na escolha do seu delegado no governo geral, e depositando n'elle toda a confiança, e demittindo-o, quando não a mereça, deve julgar e obrar pelas informações officiaes, por via de regra mais desinteressadas e sempre responsaveis, e não por indicações e insinuações incompetentes, senão malevolas e interesseiras; nem tão pouco pelas representações suspeitas, dirigidas por vias incompetentes.
   Tenho pois exposto o meu juizo e as minhas vistas a respeito da provincia que governo; e segundo ellas dirigirei portanto a minha administração, excepto quando contrariarem as disposições da lei, e as ordens do governo de Sua Magestade, que me cumpre respeitar, executando-as, ou representando respeitosamente, quando assim convier aos interesses publicos.

E agora, aindaque, como disse acima, os precedentes do governo são contrarios ao trabalho forçado nas colonias de Africa, tendo declarado, que sem elle julgo impossivel a grande agricultura colonial por emprehendimento dos europeus, a cultura civilisadora, intelligente, e verdadeiramente productiva, parece-me que não devo deixar de apresentar aqui, em conclusão do meu trabalho, algumas indicações sobre o assumpto. Se o governo de Sua Magestade se decidir a reconsiderar, como disse que seria mister, sobre muitas das providencias ultimamente adoptadas, talvez lambem se decida a adoptar algumas disposições com relação a este assumpto, onde não é por ventura indispensavel que retrograde.
 
Já indiquei como era difficil, senão é impossivel, que os colonos ou os indigenas emprehendedores podessem aqui estabelecer emprezas agricolas com trabalho livre, porque as contingencias da cultura e os lucros que produzem os generos coloniaes não lhes permiltem dar salarios que convidem a população indolente e preguiçosa a fornecer-lhes o trabalho, que precisam; assim como disse, que os poucos pretos que porventura forem laboriosos, trabalharão para si e não para estranhos. Tenho esta asserção como irrefutavel. A escravidão acha-se abolida por lei, e não é de crer que reviva, porém a lei admilte a condição de liberto, ou preto livre obrigado a dez annos de serviço em favor d'aquelle que o remiu da escravidão. Talvez d'esta sorte, apesar do praso ser curto (1), possa haver ainda uma esperança para a agricultura, se o colono ou emprehendedor agricola podér contar com esses dez annos de trabalho do liberto. Segure-se ao emprehendedor de trabalhos agricolas, mais ou menos completamente, o trabalho do escravo que remiu, sempre que esteja valido, durante o praso que a lei concede, e poderá ainda haver em Angola agricultura com algum valor. Terá porém o colono seguro o trabalho do liberto no estado actual das cousas? Não tem, porque o preto, vindo do sertão, sabe o caminho d'esse sertão, e na primeira occasião opportuna foge, ou para ali, ou para o primeiro motolo (couto de bandidos), que encontra, ou para qualquer ponto do gentio não avassallado, que não dista muito da estancia do agricultor, a quem deve o serviço (1).

1 O preto de menor idade, resgatado da escravidão no gentio, fica livre quando está educado e em estado de prestar algum servico.
   1 Veja-se a nota inseria a pag. 19 relativamente á fuga de 111 pretos, pertencentes ao cultivador de Cazengo Costa Magalhães.
A difficuldade, o problema a resolver para que haja agricultura nesta provincia, consiste em segurar ao agricultor o trabalho do seu liberto. Não será promettendo distincções honorificas, isentando os productos agricolas de todo o imposto de exportação, fornecendo utensilios, machinas e sementes, ou offerecendo valiosos premios pecuniarios; será dando aos emprehendedores segurança de braços para o trabalho que o governo de Sua Magestade promoverá a agricultura das colonias do continente africano.
Mas actualmente não ha meio de evitar tão grande mal. Não se tendo interpretado o tratado de 3 de julho de modo a não comprehender o transporte de escravos por mar entre os portos d'esta costa, nas disposições que no tratado se estatuiram a respeito das ilhas de S. Thomé, como é evidente que não são comprehendidos pela letra do tratado, e se alem d'isto se não houvesse ampliado infundamentadamente a sua applicação lilleral, comprehendendo n'ella os libertos, quando no tratado só se falia de escravos, ainda se poderia remediar, trocando os individuos do norte com os do sul. N'este caso todavia ainda a questão ficava sem resolução completamente satisfactoria para o centro da provincia, que é a parte mais importante, e os emprehcndedores ou não apparecerão, ou alguns raros que tentem, esmorecerão e abandonarão promplamente em presença de tacs difficuldades e embaraços.

Emquanto não passar muito grande numero de annos, e esse territorio comprehendido entre a costa e a linha interior de occupação acima descripta, não for domado complctamentc, e mais ou menos assimilado, emquanto ao menos os motolos, e o gentio não avassallado não deixarem de existir no meio do territorio sujeito, os libertos, vindos do interior, não offerecem ao emprehendedor agricola trabalho certo e seguro como elle precisa, e portanto não podem affluir para Angola esses emprehendedores.
O governo de Sua Magestade teria ainda um meio proficuo de promover a agricultura permittindo que os emprehendedores agricolas possam trazer libertos de paizes para onde elles não fujam, e de raças e linguas que os tornem estranhos ao gentio d'esta provincia. Foi por se darem estas circumstancias com os pretos transportados para a America, que ali se creou a agricultura tropical. Se em troca fossem trazidos para Angola indigenas americanos, ter-se-ia ella, naturalmente, estabelecido aqui do mesmo modo.
É portanto um grande meio civilisador permitlir que as provincias de Angola e Moçambique possam trocar libertos pela via maritima. Não ha n'isto a menor offensa ao tratado de 3 de julho de 1842, nem ao decreto de 14 de dezembro de 1854 e mais legislação em vigor, não ha a menor derrogação dos principios recebidos entre as nações, poisqtie se é licilo engajar pretos em África com obrigação de certo tempo de serviço, e leva-los para as colonias francezas (Doe. n.° 53), ou engajar colonos ou coolis na índia e na China com a mesma obrigação, e leva-los para as colonias francezas, hespanholas e inglezas; é ainda mais licito trazer, de uma colonia portugueza para outra da mesma nação, pretos obrigados por lei a certo lempo de serviço, findo o qual, ficam desembaraçados e poderão tomar o expediente que lhes convier.
É este um assumpto a cujo respeito o governo de Sua Magestade é livre de obrar como lhe aprouver, sem otfensa dos principios de justiça e de equidade, e pôde proceder desassombradamente sem receio de merecer censura. Assim como se trocam recrutas para o exercito, tambem se podem trocar esses recrutas para o trabalho agricola, o mais poderoso, talvez, o unico meio efficaz de civilisação para as selvagens raças africanas. Entendo pois, considerando e estudando detidamente o assumpto, que poderá talvez d'esta sorte com a legislação existente haver desenvolvimento agricola n'esta provincia.
  Aproveito esta occasião para dizer que de quasi igual medida depende todo o desenvolvimento agricola que promette o archipelago de S. Thomé e Principe. Ali so se precisa de braços, libertos, se por outro meio melhor se não obtêem, e Angola fornecer-lhe-ha largamente dos que não pôde utilisar. Deve advertir-se que Angola interessa no desenvolvimento agricola d'aquelle archipelago, porque, quando ali tenha chegado a certa altura, ha de refluir poderosa e beneficamente sobre este continente.
    Quanto porém á troca de libertos entre Angola e Moçambique, devo ainda reflectir, que este expediente so pôde ser proficuo quando em ambas as provincias haja gente pecuniosa, ou se organisem emprezas poderosas dedicadas á agricultura. Com os meios de que dispõem as pessoas, que em ambas as provincias podem hoje tentar trabalhos agricolas não lhes é possivel negociar em larga escala o serviço dos libertos trocados entre ellas, em consequencia do preço a que se elevaria a despeza de transporte; nem os armadores se animarão, como convinha, a dedicar os seus navios a tão longa navegação.
     Quando haverá porém nas duas provincias essas pessoas e essas emprezas poderosas? Tarde, sem duvida, por falta de meios, e sobretudo de impulsão protectora. Para fomentar agricultura valiosa na nossa África, na continental pelo menos, haverá inquestionavelmente necessidade de tomar-se uma medida rasgada de organisação do trabalho da população indigena, adoptando, por exemplo, um conveniente systema de servidão, do que já ha n'esta provincia uma similhança nos chamados forros, que é uma tutela rasoavel em troco de protecção condicional.

   Dou por concluido o meu trabalho. Oxalá que o governo de Sua Magestade julgue que cumpri, e n'elle encontre indicações e propostas, que mereçam ser consideradas e possam ser adoptadas com proveito da provincia e do paiz.
   Deus guarde a v. ex.a Loanda, 31 de janeiro de 1862. — Ill.mo e ex.mo sr. ministro e secretario de estado dos negocios da marinha e ultramar.= Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes, governador geral.

Texto Integral

terça-feira, 18 de outubro de 2011

ANGOLA 1977: A REVOLUÇÃO PERDIDA DE SITA VALLES

Felícia Cabrita
Quem a conheceu em Lisboa, militando pelo comunismo, guarda dela a imagem de uma «passionária» empenhada com todas as forças na causa revolucionária. Quando o PCP começou a perder terreno em Portugal, Sita Valles decidiu voltara Luanda, terra onde a «vamp» da década anterior seria agora a dinamizadora da ala mais radical do MPLA. Para deter tanto activismo, foi preciso um pelotão de fuzilamento, mas, passados quase 15 anos, as autoridades de Luanda ainda recusam revelar o que se passou.
Sexta-feira, 27 de Maio de 1977, os sinos dobram em Luanda. De madrugada, populares e militares cercam o centro da cidade, ocupam prisões e quartéis, e exigem a Agostinho Neto que cumpra os estatutos do MPLA e afaste alguns ministros corruptos. Acreditam ainda que podem ganhar para a sua causa o Presidente da República. Mas a resposta não tarda, as tropas cubanas entram a matar e em poucas horas a casa fica arrumada. Sita Valles, que se celebrizara no movimento estudantil em Portugal, e aprendera as primeiras lições de marxismo-leninismo nas fileiras do Partido Comunista Português, tem a cabeça a prémio. É uma das cabecilhas do «golpe de estado». Por uns, é acusada de estar ao serviço do imperialismo, por outros, de ser agente secreto da KGB. Uma versão de Mata-Hari que entre lençóis decidia o destino do povo angolano. É fuzilada três meses depois, sentença assinada por Agostinho Neto, o poeta.
Sita Maria Dias Valles, nasce em Angola em 1951. O pai, Francisco Valles, de origem goesa, acabara de se licenciar em Portugal e partira rumo à colónia para fazer carreira. A família instala-se em Cabinda. O futuro sorri ao jovem engenheiro-agrónomo, enquanto na Europa o anti colonialismo ganha forma e António Salazar continua surdo aos apelos descolonizadores. Sita cresce sem contradições no meio da burguesia colonial. Desde pequena que abraça grandes causas, quer desempenhar um papel belo e nobre. Faz a sua primeira aliança com Deus, coloca pedras nos sapatos para se martirizar, não perde uma missa, é devota.
Sábado, 4 de Fevereiro de 1961, um grupo nacionalista, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), ataca em simultâneo duas cadeias e um quartel da polícia para libertar presos políticos. Os colonos pela primeira vez sentem-se em perigo. Sita vive agora em Luanda, num parque florestal onde o pai trabalha para os Serviços de Agricultura. A cidade está em estado de choque. As tropas portuguesas, acabadas de chegar, invadem musseques, e milícias civis incitam os soldados ao massacre. É a caça ao «turra». Os boatos crescem na capital, é anunciado um ataque em massa a Luanda. Sita conhece pela primeira vez o medo. Apela a Deus, espalha santos pelas portas e janelas. No terraço da casa colonial, coloca estrategicamente uma fila de soldados canonizados, que defendem a família dos «terroristas».
Mas o pânico inicial esmorece, e a adolescência traz a Sita novos modelos e referências. A moda dos anos 60 pega, ela usa mini-saias e botas altas, a sua beleza toma-se lenda, dá a volta à cabeça dos rapazes e desnorteia as famílias. Na Faculdade de Medicina, logo no primeiro ano, arrecada o título de Miss Caloira. Um colega, Luís Nolasco, toma-se de amores por ela, e a chama é tão intensa que o jovem vê os exames de fim de curso a andarem para trás. A mãe do rapaz procura-a e pede-lhe que se afaste de Luanda até as provas terminarem. Francisco Valles degreda-a com o irmão, Edmar, para uma missão no Quéssua, perto de Malange. Mas a rapariga não se habitua à alimentação frugal dos missionários americanos e envia uma carta ao pai clamando misericórdia. Os religiosos, que têm por hábito ler a correspondência alheia, não gostam da mensagem, e o estágio dos irmãos acaba mal.
Nos finais dos anos 60, chegam a Angola os ecos da revolta francesa de Maio de 68. Sita descobre as contradições da sociedade em que vive. Pertence ao grupo dos «cor-de-rosa», cor do seu jornal preferido, o «Comércio do Funchal» de Vicente Jorge Silva, que galvaniza estudantes da universidade luandense e desperta simpatias pela República Popular da China. No entanto, a luta pela independência de Angola marcha a lume brando. No próprio MPLA, anos antes, em 1963, nasciam dissensões. Viriato da Cruz, um dos seus fundadores, propõe a união com a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), mas Agostinho Neto discorda. Viriato é expulso e refugia-se na China.
Matias Migueis, vice-presidente do MPLA, que também defende a união dos movimentos, é abatido meses depois. O reforço militar português em Angola e as divergências entre os grupos nacionalistas faz com que percam terreno. Em 1971, Sita e um grupo de estudantes angolanos de origem portuguesa decidem-se. Partem para a metrópole para engrossar as fileiras dos grupos antifascistas que lutam contra o regime e a favor da descolonização. Em Lisboa, reencontra o irmão mais novo, Edgar, que partira um ano antes de Angola e se tornara militante do PCP. Em poucos meses, sacode as primeiras pinceladas maoístas, é recrutada pelo PCP e apregoa um novo evangelho. Os seus profetas são Marx e Lenine e a sua causa a revolução e a ditadura do proletariado. Participa de imediato no movimento estudantil, e é membro da associação estudantil da Faculdade de Medicina, de 1971 a 1974. «Ela não sabia viver com dúvidas, tinha certezas. Era uma prática, queria concretizar-se na acção», recorda o médico José Manuel Jara, então dirigente da célula comunista de Medicina. Alguns estudantes caem nas mãos da PIDE. O silêncio é regra de ouro, quem não resiste à tortura e denuncia é marginalizado pelos colegas. «Para a Sita, era pessoa a quem nunca mais se falava», diz Jara.
É uma época de fervor ideológico, o movimento estudantil digladia-se, fazem-se «julgamentos populares» de estudantes, estala a pancadaria. Nas Reuniões Inter associativas saltam para a arena as várias correntes políticas, e as acusações chovem: «revisionistas», «sectários» e «sociais-imperialistas» são os piropos recíprocos. Abatem-se as velhas amizades. Jofre Justino, colega de Sita em natação, no Clube Nun'Alvares, desde os sete anos, está agora num campo oposto: «Na altura eu era maoísta, e estava convencido de que era ela que orquestrava os golpes vindos da União dos Estudantes Comunistas (UEC) contra nós».
Sita celebriza-se no movimento estudantil, é uma activista política e destaca-se na UEC. Mas viver com ela é um inferno. José Camisão, hoje médico, cometera o erro da sua vida: largara Angola e o curso de Medicina a meio, e seguira-a para a metrópole. Ele não tem ideais nem acredita em revoluções. Filho da alta burguesia colonial, apenas alimenta uma fidelidade: Sita Valles. Vivem maritalmente num apartamento em Campo Grande, e ele quer a todo o custo não se ver envolvido nas actividades partidárias da companheira: «Não me metas nas tuas histórias, porque se um dia sou preso pela PIDE não tenho estofo e digo tudo.»
Conselhos que ela nunca seguiu. Transforma-o no motorista dos clandestinos do Partido, e a mala do seu carro é usada vezes sem conta para esconder panfletos, o que lhe vale uma vez um mandado de captura. Mas o pai, uma figura do regime, salva-o a tempo. O 25 de Abril apanha Sita em Moscovo, é a representante da UEC no congresso do Kom-sommol (organização soviética da juventude). «Regressou completamente fascinada por Brejnev», lembra Edgar Valles. E desconfia da revolução dos cravos. Dias mais tarde, reúne-se com alguns militantes da UEC num apartamento da Avenida de Berna. «Estávamos a discutir se o golpe era positivo ou negativo», recorda Jara, um dos presentes. Sita é das mais desiludidas, o desfecho não correspondia às lições aprendidas na cartilha marxista-leninista, a dita revolução não passava de golpe militar. Mas, rapidamente, o PCP recupera: afinal tinha havido apoio popular, logo, o golpe era positivo.
Um ano mais tarde, o socialismo parece levado por maus ventos. O PCP tenta segurar o barco, mas o país desfere-lhe um golpe profundo. Nas eleições de 1975 para a Constituinte, o PS obtém a maior votação, seguido de perto pelo PPD. Um dia, Jara dá uma boleia a Sita e ela confessa-se desiludida: «A revolução aqui já deu o que tinha a dar, já não há hipótese de o país se encaminhar para o socialismo.»
Em Angola, entretanto, a desgraça adi vinha-se. A Lisboa chegam rumores de que o MPLA se encontra desfeito. A guerra civil rebenta, os movimentos nacionalistas - MPLA, UNITA e FNLA - combatem-se. Tinham aprendido na escola colonial a intolerância política. Sita, que faz parte da Comissão Central da UEC, sendo considerada a número 2, depois de Zita Seabra, arruma as malas, acena a bandeira de «Che» Guevara e vai fazer a revolução para Angola. Zita e Álvaro Cunhal tentam dissuadi-la. «O PCP estava muito interessado nas relações com Angola, » mas achava que não devia mandar para lá estudantes, porque estes tendem sempre para o desvio ideológico», lembra a então líder da UEC. «Os quadros que enviámos para lá não eram estudantes». Porém, cegos e surdos às orientações do partido, estudantes comunistas partem para Angola. Mas não vão sozinhos. Jovens dos vários quadrantes da extrema-esquerda portuguesa seguem-lhes os passos, convictos de que vão puxar os fios do destino africano.
Cruza-se com os colonos que tinham perdido o lugar ao sol e corriam para a metrópole em pânico. A família Valles chegara na remessa. Maria Lúcia, a mãe, tentara convencer Sita a ficar: «Olha que te vão cortar em postas». A filha, como resposta, oferecera-lhe um livro e resumira-o: «Mãe, esta mulher perdeu um filho. Enquanto ele era vivo, não concordava com as posições dele. Quando ele morreu, começou a lutar pelos ideais dele.» Era A Mãe, de Gorki.
Sita Valles aterra em Luanda (no Verão de 1975. Agostinho Neto recusa-se a dialogar com Holden Roberto e Jonas Savimbi. Os Acordos de Alvor, onde os três movimentos tinham negociado, em Janeiro, um governo de coligação que preparasse o país para eleições gerais, caem por terra. Neto recebe apoios da Jugoslávia, armamento entra nos portos de Luanda e tropas cubanas ajudam-no a correr com os adversários. É a luta pelo poder total. A11 de Novembro, proclama a independência e reivindica o reconhecimento internacional. Mas o Presidente da República não está contente.
Era preciso consolidar a unidade do país, uniformizar, esmagar a divisão. E o MPLA, movimento constituído por várias tendências políticas, tem de arrumar a casa. Nito Alves, um dos heróis da guerrilha, agora ministro do Interior, é o homem de mão de Neto para combater as minorias. Começam as perseguições à Organização Comunista de Angola (OCA), com ligações à extrema-esquerda portuguesa, acusada de esquerdismo; e à Revolta Activa, liderada por Joaquim Pinto de Andrade, um dos presidentes de honra do MPLA até 1973, considerado agora um pequeno-burguês.
A Direcção de Informação e Segurança de Angola (DISA) instala-se e estende as suas malhas. Vicente Pinto de Andrade, da Revolta Activa, um dos muitos presos, recorda: «Agostinho Neto era um ditador, queria eliminar todos os grupos que lhe fizessem sombra, era incapaz de dialogar». Haverá uma só voz neste país, dizia o poeta-presidente.
Nas prisões, a tortura é sistemática. A história de Angola começa mal: em nome da revolução, a vida deixa de ter sentido. Sita sobe depressa nas estruturas do MPLA, apoiada por Nito Alves, que se deixa fascinar pelo dinamismo da «Passionária» angolana. Assume importantes funções no departamento de Organização de Massas, mas depressa cria ódios entre os velhos dirigentes do MPLA. Nas reuniões do Bureau Político, acusam-na de ser uma infiltrada do PCP para controlar Angola. E o MPLA expulsa todos aqueles que militaram anteriormente noutras organizações políticas, mesmo aliadas. Sita não escapa à exclusão, mas nem isso diminui o seu fervor revolucionário. A 4 de Janeiro de 1976, escreve aos pais e, para tranquilizar a família católica, anuncia o casamento com o angolano José Van Dunem, comissário político do Estado-Maior Geral. No entanto avisa-os: «Não interessa politicamente que divulguem o casamento, porque eu fui do PCP e ele é dirigente do MPLA. Isso compromete-o politicamente. O MPLA não é comunista.»
Em Moscovo, nesse ano, Nito e Van Dunem assistem com Cunhal e Fidel Castro ao 25º aniversário do PCUS. Passados meses, Nito perde o lugar de ministro do Interior. No MPLA cava-se novo fosso: de um lado, Neto e alguns velhos dirigentes, adeptos de uma via «terceiro-mundista», de características semelhantes à argelina e com aproximações à Jugoslávia; do outro, Nito, Van Dunem e Sita, fiéis à ortodoxia soviética.
A 8 de Fevereiro de 1977, nasce Ernesto, o primeiro filho de Sita e de Van Dunem. «Demos-lhe o nome de 'Che' em homenagem a Guevara», escreve aos pais. Continua defensora da causa do proletariado. E desconhece que a história revolucionária é de todas a mais sangrenta. «Nós, na altura, desconhecíamos o que se passava na URSS, pensávamos que o que se dizia era obra da propaganda», recorda Amadeu Neves, angolano, militante do MPLA, seu «compagnon de route» e hoje no Partido Renovador Democrático angolano. Em 21 de Maio, uma comissão de inquérito, nomeada pelo Bureau Político e dirigida por José Eduardo dos Santos, chega à conclusão de que há «fraccionismo» dentro do próprio MPLA. Nito e Van Dunem são expulsos do Comité Central nesse mesmo dia. À noite, José Mingas - irmão do actual embaixador angolano em Portugal, Rui Mingas -, chefe de operações da DISA, avisa a família Van Dunem de que vai haver muitas prisões e que Sita e o companheiro têm a cabeça a prémio. Começa a girândola que de novo mancha de sangue a história de Angola.
Nos dias seguintes, o grupo reúne-se e prepara a ofensiva. Mas nem todos estão de acordo quanto aos métodos a utilizar. Responsáveis das FAPLA (o exército angolano) pertencentes ao Comissariado Político são a favor de um golpe militar. Amadeu Neves encabeça essa linha: «Tínhamos os militares todos do nosso lado. Se fosse um golpe militar, teríamos tomado o poder em meia hora.» Mas Sita e José Van Dunem, fiéis ao espírito bolchevique, não concordam: «Tem de ser uma insurreição popular. Os militares irão na retaguarda para defender o povo». Têm um osso duro de roer pela frente: as tropas estrangeiras. «Os cubanos sabiam muito bem que havia um grande descontentamento em Angola, e nos contactos que mantivemos tinham prometido que não iam interferir nos assuntos internos do país», garante Amadeu Neves. Num encontro na casa da família Kitumba, o conselheiro da embaixada da URSS repete sete vezes: «Só vos apoiamos se não for um golpe militar».
Na madrugada de sexta-feira 27 de Maio, populares e militares enchem as ruas de Luanda e tomam quartéis e prisões para libertarem presos políticos. Enquanto Sita, nos musseques, incita os operários à revolta, duas mulheres, Virinha e Nandy, dirigentes do destacamento feminino das FAPLA, dirigem o assalto à cadeia de S. Paulo. Hélder Neto, chefe da INFANAL - serviço de Informação e Análise - órgão paralelo à DISA, encontra-se desde as seis da manhã na prisão e é apanhado de surpresa. O feitiço virava-se contra o feiticeiro. Vítor Jeitoeira, um colono português recuperado pela DISA, hoje reformado e negociante de terrenos em Portugal, conta: «Hélder Neto tinha ordens para, nesse dia, começar a prender os adeptos de Nito. Estava lá a preparar a prisão para receber uma nova vaga de gente.»
Quando Hélder Neto percebe que está a perder o controlo da situação, liberta alguns presos e entrega-lhes armas para defenderem a cadeia. É um deles, Sambala, um cantor popular detido por delito comum, que o prende pelos braços, quando ele abre as portas da cadeia para negociar com os populares. Nandy, grávida de oito meses, toma a cadeia, e Hélder suicida-se. Já não se sabe quem é quem. Sambala, ávido de acção, encosta os presos da OCA e da Revolta Activa à parede e carrega a arma. Vicente Pinto de Andrade vê a vida a andar para trás. «Foi a Nandy que o impediu de nos matar. Abriu-nos as celas, deu-nos comida. Era uma espécie de 25 de Abril».
O actual secretário-geral do PRD angolano, Luís dos Passos, num jipe com seis militares, dirigia a tomada da Rádio Nacional, enquanto os populares que saíam dos musseques engrossavam a coluna. Mantém-se em contacto com Sita e Van Dunem, que têm por missão a mobilização popular: «Ela estava optimista, as pessoas dos musseques estavam todas a responder ao apelo.»
Às oito da manhã, ouve-se um locutor na Rádio: «Dizem que o major Nito Alves é fraccionista, mas os verdadeiros fraccionistas são os que estão no poder e querem fechar os olhos ao nosso mais velho camarada, Agostinho Neto. São os camponeses e os operários que devem guiar o pais.» Quando Saidy Mingas, o outro irmão de Rui Mingas, fiel a Neto, entra no quartel da Nona Brigada para tentar ganhar as tropas, é preso pelos soldados. Ele e outros militares contrários à revolta são levados por populares para o musseque Sambizanga.
O Governo leva tempo a reagir, Neto está sem tropas. Mas, de repente, a situação muda. Na rádio, entre o choro de mulheres, ouvem-se gritos cubanos. O Presidente tinha ganho o exército de Fidel, e, com Henrique dos Santos, nome de guerra Onambwe, director-adjunto da DISA, punha cobro à insurreição. «Conduzi a única tropa organizada do MPLA que restava para controlar o golpe», conta o ex-responsável pela polícia secreta. Os soldados abrem fogo e os manifestantes dispersam, ficando pelo caminho muitos mortos e feridos. Para Sita, que se encontra num Comando de Operações, a notícia do esmagamento da revolução chega como um dobre de finados. E prepara a fuga.
Pelas 16h00, a cidade está controlada, e os manifestantes procuram refúgio. Mas no Sambizanga ouvem-se tiros. Saidy Mingas e Eugênio Costa estão entre os comandantes mortos. No começo da tarde, reina o silêncio na cidade. Na Rádio Nacional ouve-se uma voz vacilante. Neto resume os acontecimentos que por poucas horas abalaram Luanda. Ele próprio está confuso: «Hoje de manhã, pretendeu-se demonstrar que já não há revolução em Angola. Será assim? Eu penso que não... Alguns camaradas desnortearam-se e pensaram que a nossa opção era contra eles. (...) Temos países amigos que não compreendem bem a nossa opção.» Era o recado à URSS. No dia seguinte já o seu discurso mudara. Publicamente, anuncia que alguns comandantes do MPLA tinham sido mortos pelos «nitistas». Entre eles, cita Hélder Neto. Jeitoeira, um operacional da DISA, varia na versão. Assiste ao enterro do chefe da INFANAL, vê o corpo, não tem dúvidas de quem partiu o tiro. A própria viúva de Helder confidencia-lhe: «Ele suicidou-se, mas o MPLA não quer que se saiba.» Criam-se vítimas para justificar o massacre.
Para Rui Mingas, que perde dois irmãos nos dois lados da barricada, a história está por resolver. «O Saidy era uma pessoa muito odiada no MPLA. Sabia demais...» A presença de Eugénio Costa entre as vítimas também causa embaraços. Jeitoeira diz de sua justiça: «É estranho, porque nós sabemos que na noite anterior ele tinha estado com alguns fraccionistas a preparar o golpe.» Nesse mesmo dia, centenas de pessoas são presas, e fuziladas. É a caça às bruxas. Nos jornais de Angola lê-se: «Os criminosos serão fuzilados.»
E Agostinho Neto, publicamente, pronuncia a sentença: não haverá perdão. No dia seguinte, às 19h00, o responsável do cemitério de Calema está a jantar com a família quando recebe um telefonema estranho.
O seu chefe de repartição ordena-lhe que volte ao cemitério e aguarde. O cacimbo ensopava-lhe a roupa quando, de madrugada, param no portão dez carrinhas celulares. Carlos Jorge e Nelson Pinheiro (Pitoco), elementos da DISA, chefiam a expedição, que estaciona junto a uma vala comum de 200 metros. Mal os prisioneiros se apeiam, soam as rajadas das «kalachnikov». Alguns ainda têm tempo de gritar: «Salvem-me que eu não fiz nada». Pitoco, chefe do pelotão de fuzilamento, atende rápido ao apelo das vítimas: «Esse é perigoso, fica para mim.» Um dos coveiros aplana a terra da vala com um tractor.
Ainda se ouvem gemidos. O chefe do cemitério está aterrorizado e Pitoco avisa-o: «Em Angola não pode haver contra-revolução, por isso, se falares, vais fazer companhia a estes.» A própria DISA abate elementos das suas fileiras. Não há julgamentos nem advogados presentes. José Mingas, com 33 anos, é um dos 52 nomes que fazem parte da lista dos condenados à morte. Acusação: «Aproveitando-se do cargo de chefia que ocupava, desviou documentos classificados que entregou aos cabecilhas fraccionistas. Manteve contactos conspirativos com Zé Van Dunem.» Outros morriam apenas porque confessaram ter lido e divulgado as Treze Teses de Nito Alves, panfleto em que o autor acusa o MPLA de não cumprir os estatutos e denuncia ministros corruptos. 
 
Felícia Cabrita
 
Origem:http://psitasideo.blogspot.com/2007/10/revoluo-perdida-de-sita-valles.html


A SITA VALLES E O PECADO ORIGINAL DA EXTREMA ESQUERDA

A propósito de um texto do Público, da autoria de José Manuel Fernandes, recordando Sita Valles, tida como uma espécie de heroína/mártir, morta às mãos do MPLA na sequência do 27 Maio de 1977, recordo outras pessoas também envolvidas em revoluções ou candidatas a elas.
Da malta de extrema esquerda (incluindo os PC's) do "meu tempo", isto é, activos desde poucos anos antes do 25 de Abril, só os afectos ao MPLA pasaram pela experiência de o seu partido ter chegado ao Poder, com todas as consequências que isso acarreta.
E não é nada pouco: todos nós defendíamos regimes totalitários (que eram o nosso modelo) de partido único em que a polícia política e a repressão dos adversários políticos (inclusivé dentro do Partido...) eram instrumentos imprescindíveis para manter o Poder.
Essa circunstância, essa colagem a ditaduras implacáveis, é o que eu chamo o PECADO ORIGINAL DA EXTREMA ESQUERDA.
Não éramos suficientemente novos (nem ignorantes - nem surdos) para não sabermos o que era o KGB, a Stasi, e as réplicas nas "democracias populares", Chinas e quejandos.
Assim, quando uma Sita Valles se envolve num golpe (sangrento) que não triunfa e é reprimido de forma sangrenta (e de que maneira!) parece-me ridículo que se endeuse a Sita por ter sido morta (e violada, ao que se diz) pelo MPLA-Neto e não se pondere no que ela teria feito (ou mandado fazer...) se a facção triunfante tivesse sido o MPLA-Nito.
Conheci pessoalmente o Nito Alves no período entre o 25 de Abril e a independência de Angola, mas nunca me recebeu depois da independência, se bem que tenha abonado o meu "salvo conduto" para entrar em Angola, onde permaneci até 1988 e onde estava aquando do 27 de Maio. Talvez o facto de não me ter recebido me tenha livrado de ser expulso de Angola após o 27 de Maio. Nunca falei com a Sita, mas conhecia-a bem como irmã de um colega de Liceu (também ele morto depois do 27 de Maio) e de Lisboa, do meio associativo pré-25 de Abril.
Não tenho grandes dúvidas que o extremismo ou pureza ideológica (o que quer que isso fosse) do grupo teria feito séria mossa em Angola principalmente em comparação com o regime de José Eduardo dos Santos, muito mais pragmático e moderado que o entretanto falecido Guia Imortal...
No meio disto tudo, a malta universitária, envolvida "em política", que chegou "ao poder" com o MPLA, naturalmente envolveu-se nas estruturas governamentais, inclusive na polícia política.
Que horror!, dizem colegas meus, envolvidos até ao pescoço em movimentos que tinham a China, a Albânia e outros "paraísos" como modelo, com uma cara de pau e uma hipocrisia que me espanta.
Como teríamos procedido nós outros se, por absurdo, o nosso PCP, ou a nossa UDP ou nosso glorioso MRPP tivessem chegado ao Poder? Hã?! Como?
Por essas e outras é que eu sempre mantive um relacionamento perfeitamente normal com os puristas do MPLA ou de grupos de extrema esquerda e também com a malta do MPLA, inclusive da DISA.
Numa festa de aniversário (meu), reuni um lote de ex-presos políticos (os tais puristas OCA's, Comités Amilcar Cabral, PCP Angolano, etc) meus compinchas de pesca e Mussulo, com um con-cunhado meu que eles bem conheciam dos tempos da prisão por ser membro destacado da polícia política. Fui um bocado criticado pela brincadeira, mas a coisa correu sem chatices e toda a gente se portou na linhaça...
Esse meu con-cunhado e a Sita Vales (ele, José Vale, padrinho de casamento do irmão da Sita) estão ambos mortos. Seria engraçado imaginá-los no Além (em cima ou em baixo...) a contarem um ao outro como teriam sido os seus papéis se o resultado do 27 de Maio tivesse sido inverso...
...e a rirem-se dos que lhes chamam heroína e torcionário.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Salazar recusou oferta milionária de Washington para comprar as ex-colónias


"SALAZAR RECUSOU OFERTA MILIONÁRIA PELA COMPRA DOS TERRITÓRIOS DE PORTUGAL"


Na década de 60, os Estados Unidos fizeram uma proposta de centenas de milhares de dólares a Portugal, a troco da independência das províncias ultramarinas.
A resposta do Presidente do Conselho Prof. Dr. António de Oliveira Salazar foi:
"Portugal não está à venda".
Esta como muitas outras ‘revelações’ foram feitas por Witney Schneider, ex-responsável norte-americano pelos Assuntos Africanos, no seu livro ‘Engaging Africa: Washington and The Fall of Portugal’s Colonial Empire’.
O caso remonta a 1963, quando o ex-Presidente do Conselho rejeitou a referida oferta, num encontro com um enviado americano – relata Witney Schneider, antigo vice-secretário de Estado adjunto para os Assuntos Africanos na administração Clinton.
O livro foi elaborado com base em documentos oficiais e dezenas de entrevistas com personalidades americanas e portuguesas.
Segundo Schneider, Paul Sakwa, assistente do vice-director de planeamento da CIA elaborou em 1962 o 'Plano Commonwealth’, que defendia nomeadamente uma autodeterminação para Angola e de Moçambique, após um período de transição de oito anos, durante o qual Portugal seria compensado com cerca de 500 milhões de dólares.
Em Agosto de 1963, o diplomata americano Chester Bowles encontrou-se com Salazar e duplicou a proposta: durante cinco anos, os EUA depositariam nos cofres portugueses cerca de mil milhões de dólares. Porém, a oferta esbarrou na intransigência de Salazar na defesa de Portugal.
Schneider adiantou ainda que tanto Eduardo Mondlane, Moçambique, como Holden Roberto, Angola (FNLA), foram durante anos apoiados financeiramente pela CIA.
No período em questão, o governo americano apoiou financeiramente e lidou estes movimentos terroristas destas duas províncias ultramarinas portuguesas, ao mesmo tempo que mantinha relações diplomáticas com Portugal.


Gonçalo Curião/C. da Manhã

domingo, 16 de outubro de 2011

OS LANDINS EM MACAU "da leitura das estrelas ao pragmatismo"



 de Pedro Dá Mesquita, em Lisboa
Revista Nam Van nº 23 - 1 de Abril de 1986



Quis o destino que os landins, povo aliado com os deuses, que o fizeram feiticeiro, se tornasse no exemplo mais acabado de soldado africano ao serviço do exército colonial português.

Estávamos em 1904 e pelo regulamento assinado pelo comissário régio de Moçambique, Mousinho de Albuquerque, todos os homens válidos seriam sujeitos a uma inspecção, a ter lugar de dois em dois anos, para servirem nas companhias expedicionárias e nas companhias de indígenas, estas integradas exclusivamente por elemento landins.

Da passagem de uma vida que se perdia na memória dos tempos, feita pela leitura das estrelas, dos ventos e das nuvens, colocando cada landim numa posição superior e desta superioridade vivendo, a história militar portuguesa coloca estes homens de sorriso permanente e de selváticas paixões, numa alta estima a julgar pelo testemunho do próprio herói do aprisionamento do Gungunhana, que escreveu a dado passo no seu livro «Moçambique» que os landins eram de todas as tropas de negros ao serviço de Portugal as que revelaram «maior instinto guerreiro».

Com tão boas referências, depressa estes homens deixaram a sua terra para servirem em Angola, Timor e Macau, tendo chegado a este último território no ano de 1911, marcando nas cinco décadas seguintes uma presença regular naquele enclave, então colónia portuguesa.

Para quem conhecesse os landins por alturas dos finais do século passado, dificilmente imaginaria que este povo orgulhoso se tornasse alguma vez num soldado disciplinado, temerário, ao serviço de um exército regular.

Armado de escudo, adornado de peles e com zagaias, com as quais desferiam o primeiro golpe em direcção aos rins da vítima, os landins eram uma das etnias mais temidas e conhecidas de todo o Moçambique.

Contam as crónicas que qualquer número de landins, por mais insignificante, que passasse por qualquer aldeia, por mais pobre que ela fosse, quase que por magia - não fossem eles feiticeiros surgia logo farinha para fabricarem o seu pão favorito, sempre acompanhado por um bom número de cabritos e galinhas

As principais vítimas desta pilhagem permanente era o povo quiteve, que para além de se ver despojado de boa parte dos seus bens, era obrigado a carregar todos os mantimentos dos landins, pois estes nunca tinham «pegado em cargas».

Aliás, conta-se uma história bem curiosa sobre os costumes deste povo que fez um pacto com o céu.

Nas suas permanentes deambulações, os landins conceberam uma forma assaz curiosa de tributação: abriam um furo no alto da cobertura cónica das palhotas circulares, obrigando depois a enchê-Ias até que estas se recusassem a receber mais.

Esta tendência de acumular veio a manifestar-se bem mais tarde em Macau, embora já a nível individual e sob a forma de pré (2 mil escudos em 1950) por todos os elementos voluntários que estiveram em comissão de serviço no território, ficando célebre um desembarque em Lourenço Marques, em 1932, que vinha de tal forma provido de mercadoria que pagou 18 contos de réis em direitos aduaneiros, e isto não obstante a «vista grossa» por parte dos funcionários da alfândega.


O primeiro par de botas

Providos de uma excelente compleição física - cuja média ultrapassava o metro e setenta de altura - com uma boa capacidade de aprendizagem, com um bom espírito combativo e de tempera­mento alegre, os landins foram considerados as melhores tropas coloniais portuguesas.

Após um recenseamento, eram sujeitos a uma recruta de três a seis meses onde lhes era ministrado o manejo das armas, o aprumo mili­tar e uma instrução mínima. De­pois eram enviados para Angola, Timor e Índia na situação de obrigatoriedade, tendo sido recrutados mais de cem mil entre 1916 e 1918, durante a I Grande Guerra.

O primeiro contigente a embarcar para Macau deixou Lourenço Marques em 11 de Dezembro de 1911 com a 8ª Companhia Indígena, acompanhada de uma secção de bateria mista.

Com um par de botas - as primeiras que calçavam na sua vida - um capacete de ferro, que lhes dava um ar muito mais marcial, e com um uniforme do qual ressaltavam uns largos calções, cerca de duas centenas de landins desembarcaram em Macau nos primeiros dias de 1912, deixando desde logo uma forte impressão, quer na comunidade portuguesa, quer mesmo na chinesa ao realizarem um batuque no qual teve papel importante o manejo das terríveis zagaIas.

Devido ao facto de serem tropas muito bem treinadas e muito disciplinadas, e de serem - segundo Mousinho que as utilizou em primeiro lugar - «umas sentinelas admiráveis» foram colocados nas Portas do Cerco, ponto nevrálgico, sobretudo após a implementação da República Chinesa e onde se tinham registado alguns incidentes.




A coronhada landim

Com fortificações que permitiam a presença de uma companhia, a unidade estacionada nas Portas do Cerco estava sujeita a um trabalho violento, quer no aspecto físico, devido às constantes vigias nas 24 horas do dia, quer pelos incidentes que se repetiam quase diariamente com as tropas colocadas do outro lado da fronteIra.

O dia começava com o retirar dos cavalos-de-frisa pelas 8 horas, que eram colocados a cerca de 30 metros diante das Portas do Cerco, seguindo-se-Ihe o manejo de armas, colocação nos postos e instrução vária. A tarde, os soldados estavam encarregados de diversos melhoramentos nas instalações, encerrando a fronteira pelas 18 horas.

Equipados com espingardas de bom alcance, bazucas, canhões, anti-tanques e várias metralhadoras, as tropas landins colocavam-se em menos de três minutos nos seus postos após soar o alarme, facto que acontecia nas ocasiões mais díspares para manter a eficiência da unidade.

Após a natural apreensão relativamente à recepção que iriam dar aos landins, estes foram bem aceites pelas três comunidades em questão (portuguesa, chinesa el colegas de armas).

Depressa ganharam fama de soldados disciplinados, não só através das inúmeras histórias mas também pelas anedotas que se contavam a seu respeito. Uma delas conta o sucedido com um soldado landim que estava de serviço à residência do governador de Moçambique e deu uma forte coronhada num director dos caminhos de ferro do Transval, que na ocasião (uma greve) insistiu em transpor uma vedação, e que mais tarde iria provocar certos dissabores ao próprio Mousinho. Instado a defender-se por ocasião de um breve inquérito que ficou arquivado e das razões que o tinham levado a tomar aquela atitude, o soldado limitou-se a responder: - «Faça, alto, palavra de honra, faça fogo».

O prestígio junto das comunidades em Macau foi subindo à medida que eles se iam integrando na vida normal da cidade, sendo vistos nos dias de folga, sempre em grupos, invadindo as lojas centralizadas na Rua Almeida Ribeiro numa azáfama em adquirirem um conjunto mais ou menos fixo de bens: bicicletas, fatos, máquinas fotográficas, arcas em cânfora e outros objectos que afanosamente guardavam como penhor de dois anos de comissão de serviço voluntário em Macau com um bom pré (2 mil escudos em 1950) e isto numa altura em que Macau tinha uma vida mais barata do que em Moçambique ou Portugal.

Por outro lado, um dos passatempos favoritos dos landins ao chegarem a Macau - conforme nos relata o coronel Pedro Barcelos que comandou uma companhia dej landins nas Portas do Cerco entrei Junho de 1951 e Setembro de 19521 - era o de se fazerem transportar nos riquexós, já que parece que «lhes dava um grande prazer o serem levados a custa de braço, pelas ruas de Macau e perante um clima tão extenuante.



A fotografia de rectaguarda

Fora disso e para além de umas visitas esporádicas à rua da Felicidade (ninguém poderia ter escolhido um nome mais sugestivo...), o seu relacionamento foi sempre muito bom, sendo somente de recordar, pelo seu aspecto caricato, um episódio ocorrido em 1931, quando um grupo de dez soldados e 2 cabos landins foi escolhido para representar as forças expedicionárias de Moçambique na exposição colonial de Paris.

Como já dissemos, os landins são dotados de uma excelente estatura física, tendo sido escolhido um deles para servir de soldado tipo para uma fotografia que iria incentivar os seus conterrâneos por altura do recrutamento.

A semelhança do que se fez para o «poster» do recrutamento, foi escolhido um grupo que estava estacionado em Macau, que por tradição recebia os melhores homens; só que na foto em que se via o oficial branco no meio dos soldados o seu tamanho era nitidamente mais baixo do que o dos seus subordinados, o que, de acordo com a mentalidade da época, era visto como uma prova de inferioridade.

A solução encontrada foi simples: preparou-se uma segunda foto, tirada no campo onde se vê uma coluna seguindo na frente os landins e na rectaguarda o guia, dando assim maior corpulência ao europeu.

Mas a vida dos landins não foi só este ritual de compras e de actividade militar, facilmente notado pelo «Bayte», uma saudação tipicamente landim, uma espécie de mistura de sinais que fazem lembrar um aceno e uma continência e que servia como factor de unidade na vida civil, já que todos os antigos soldados se cumprimentavam deste modo, o que dava ainda mais animação as já animadas ruas de Macau.

Na sequência de incidentes fronteiriços o comando militar de Macau achou por bem transferir para uma unidade estacionada na ilha da Taipa a companhia que tinha estado envolvida, não só para desanuviar a situação como também para evitar futuros incidentes com uma unidade já por si excitada.

Até ao final, a companhia limitou-se a fazer missões de observação e de defesa da ilha e a participar, com o acostumado brilho, na cerimónia do 10 de Junho por ocasião do juramento de bandeira de vários recrutas de Macau, onde realizavam exercícios físicos e demonstrações militares, completados com um concerto dado pela orquestra de corda e de um coro formado inteiramente por landins, tudo isto com o mesmo aprumo com que combatiam.

Para definir estes homens alegres damos a voz ao coronel Pedra Barcelos: «o landim é um pragmático, cumpre sempre à risca aquilo que lhe dizem», daí talvez o facto de muitos deles terem dado coronhadas na cabeça de muitos imprevidentes transeuntes, que fugindo ao sol estival numa procura de uma árvore passavam por detrás das guaritas instaladas nas Portas do Cerco...



Vértices de uma presença

Rua da Felicidade, cachaça, danças tribais

A partir de 1948, os contingentes africanos (da Guiné, Angola e Moçambique) recrutados para Macau, totalizavam, entre praças e cabos, cerca de 500 elementos, e estavam aquartelados na Fortaleza da Guia, em Mong-Há, na Ilha Verde e nas ilhas de Coloane e da Taipa.

Entre as 15 e as 18 horas, isto é, durante o período de licença, os soldados africanos, ou visitavam a Rua da Felicidade, ou passeavam pelas ruas de Macau, nos riquexós (alguns já bastante afectados pela cachaça).

À noite, no quartel, e quando as circunstâncias o permitiam, acendiam uma fogueira, onde uma conversa algarviada tentava evocar, sem desânimo, os horizontes longínquos da terra natal.

Apesar disso, o soldado tentava adaptar-se à vida ocidental. Uma forma de aculturação - e talvez a principal- terá sido a religião já que quase todos estavam baptizados, ou pelo catolicismo, ou por tendências cristãs protestantes. Ambas as tendências tiveram muito sucesso na sua influência junto das tropas africanas.

No que diz respeito aos católicos, havia em todos os quartéis uma delegação da Legião de Maria e na Gruta de Nossa Senhora de Fátima, cantava-se o terço todas as noites. Saliente-se também que alguns africanos chegavam a catequizar os seus conterrâneos.

As suas funções no quartel consistiam, para além dos exercícios militares diários, em trabalhos de faxina e de conservação de estradas.

Apesar das doenças que, muitas vezes faziam abater ao afectivo em tantos soldados africanos, estes ficavam em Macau normalmente durante o período duma comissão de dois anos.

Em 1974 já não existiam referências à sua presença e em 1975 é extinto o Comando Territorial Independente de Macau, apagando-se, assim, todos os traços da mentalidade africana que foi utilizada para diversos propósitos, mas que também nunca abdicou da sua originalidade e tradições. (P.J.L.)

* PMM: o autor do último artigo identificou-se apenas através das iniciais P.J.L.

Revista Nam Van foi uma publicação do Gabinete de Comunicação Social do Governo de Macau
Nossos Agradecimentos

Publicação Agosto 2010