quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Angola, o meu grito... o meu apelo! Contra a indiferença...

Sexta-feira, 27 de Fevereiro de 2009
Escrevo sobre Angola, país que me viu nascer, já lá vão 57 anos. Porque decidi uma vez por todas na minha vida sobrepor ao “politicamente correcto” o “humanamente correcto” e porque já não aguento assistir à tragédia da grande maioria dos angolanos, e porque o meu silêncio se tornou ensurdecedor perante a minha consciência, quero lançar aqui um grito de dor e de protesto assim como um veemente apelo em nome de um povo heróico, mártir e esquecido: o povo angolano, o meu povo irmão. Na tragédia em curso há décadas, só e apenas ele é merecedor de carinho, respeito e admiração porque só e apenas ele está isento de culpas.

Culpados foram e são, porque se deixaram moldar pelas teias da política internacional e pela corrupção, uma boa parte dos seus dirigentes, passados ou presentes, no governo ou na oposição, a comunidade internacional com as suas gananciosas interferências e os seus planos de (des)ajustamento estrutural e certos governantes portugueses perfeitamente ignorantes da História e das gentes (tão merecedoras de carinho, respeito e admiração) de África em geral e de Angola em particular. A todos eles acuso de serem os responsáveis directos do genocídio passado e do sofrimento ainda em curso, em Angola. Nenhuma dessas entidades pode, nem poderá nunca furtar-se, em consciência, das enormes responsabilidades que teve e tem no germinar, no eclodir e no arrastar do indizível sofrimento e morticínio que esmagou e continua a esmagar o povo angolano. Activa ou passivamente, embora em diversos graus, todos incentivaram (ou cinicamente fingiram que não era nada com eles) o desentendimento e a desconfiança mortais, a corrupção escandalosa, o armamento desenfreado, a ganância sem limites, a indiferença assassina, a cobardia irresponsável... Em suma, o desgoverno total que engendrou uma Angola, sofrida e mutilada por várias gerações, onde coexistem um punhado de multimilionários cleptopatas e milhões de miseráveis que deambulam perdidos e deslocados, na esperança muitas vezes vã de encontrarem uma instituição que lhes acuda com um pouco de arroz, alguns medicamentos e um agasalho, ou, na sua falta, uns restos num contentor de lixo, com que enganar a fome e morrerem silenciosamente...ignorados!

Conseguiram assim, transformar um grande e riquíssimo país (talvez por isso mesmo!), embora hoje em fase de recuperação, sobretudo em Luanda e nas capitais provinciais, num dos países com maior grau de destruição, com maior número de amputados e de minas antipessoais e com menor índice de desenvolvimento do Mundo: a nefasta sinergia da corrupção, da incompetência, da cobiça e indiferença internacional perante o sofrimento alheio, assim como a mortífera intolerância entre os angolanos fizeram de Angola, com as suas fabulosas potencialidades humanas, agrícolas, pecuárias, piscatórias, mineiras (diamantiferas, petrolíferas e muito mais), cinegéticas, turísticas ... um amontoado de miséria que deveria comover o mais insensível e empedernido dos homens fosse ele angolano ou estrangeiro, simples cidadão ou governante. Pelos vistos, os responsáveis directos por todo esse descalabro ainda não se comoveram... a matança dos inocentes continua! Anonimamente…

Angola tem hoje, finda a guerra civil mortífera em 2002 que para os responsáveis directos tudo parecia explicar e justificar..., a derradeira ocasião de se reencontrar. Essa ocasião não pode ser desperdiçada: acabaram os subterfúgios, as mentiras e as desculpas descabidas. Os angolanos, e essencialmente eles, com particular responsabilidade para os seus dirigentes, têm o dever e a possibilidade de reporem Angola no mapa do Mundo, tornando-a num exemplo para toda a África. Tal só acontecerá se os governantes e a sociedade civil angolana agarrarem com unhas e dentes os poucos trunfos de que Angola dispõe, nomeadamente o seu povo, os seus minérios, as suas enormes potencialidades agropecuárias, piscatórias, turísticas e o petróleo. Desde já lanço um alerta aos dirigentes africanos mais clarividentes e responsáveis: em certos círculos geopolíticos anglosaxonicos já se ousa falar e escrever da necessidade, como sempre em nome do bem dos povos, de se começar a pensar na eventualidade da utilidade de uma nova recolonização...noutros moldes... evidentemente... CUIDADO! Tal não pode acontecer mas só não acontecerá se, de uma vez por todas, os dirigentes interiorizarem que o maior património dos seus países é o seu povo, sendo por isso fundamental investir na educação, na saúde e numa agricultura diversificada, em vez de se iludirem com o agastado discurso do país “Grande” e “Rico”; se fizerem as leituras correctas, com as implicações decorrentes, do que está a acontecer na perversa e nada ética revolução mundial em curso, e se pugnarem verdadeiramente pela tolerância e concórdia nacional (estou a pensar especificamente em Cabinda, atropelada pela História da descolonização e sempre sofredora) e implementarem a Democracia e uma Boa Governação que, como é óbvio, não se coaduna de modo nenhum com a tentacular corrupção que foi e é, quanto a mim, a maior responsável do estado em que Angola e África estão, com nefastos e devastadores efeitos equiparados, ou até superiores, aos da guerra. É tempo de se assumir esta verdade!

Só assim, acredito, é o meu sonho!, o povo angolano alicerçado no seu sofrimento e sustentado pela sua sociedade civil, embora ainda fraca e dispersa mas cada vez mais sensibilizada, organizada, interveniente e exigente poderá enfim construir uma sociedade democrática e encontrar o caminho da Paz, da Concórdia e da Responsabilidade que o conduzirá ao amanhã radioso com que há tanto sonha e ao qual tem direito, como todos os povos. É da mais elementar justiça e não lhe resta outra alternativa para sobreviver!

Não posso terminar sem fazer um último apelo: que o povo português nunca esqueça, apoiando-os, os povos irmãos angolano e cabinda com o qual partilha tantos laços de sangue e de História. Eles merecem.
 

 Fernando José de La Vieter Ribeiro Nobre
ORIGEM


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Terça-feira, 25 de Maio de 2010
Hoje comemora-se o Dia de África.

Hoje, não vos falar em números, vou falar-vos de sonhos…
Como disse o meu querido amigo José Manuel Barata Feyo num brilhante artigo que escreveu na revista Grande Reportagem sobre “O fim das ilusões”, “Os números são sempre enfadonhos. Em África, são cruéis”.

Esses números aterradores (avanço dos desertos, guerras civis, máfias diversas, tráfico de armas, mortes infantis, malária, tuberculose, fome, corrupção, prostituição infantil, pobreza, refugiados, etc.) sobejamente conhecidos de todos, são autênticas explosões que só não acordam as consciências mais indiferentes ou em coma. Quanto aos homens e mulheres ainda vivos só lhes resta darem as mãos e fazerem frente pois o grito da revolta pela justiça nunca morrerá.

Tenho o sonho de que o Homem seja protegido e acarinhado como o mais precioso dos “monumentos” pois qualquer Homem, como ser vivo, é sem dúvida a obra-prima mais perfeita e única que jamais surgiu no nosso planeta.

Sonho em fortalecer o movimento humanitário para que, actuando no terreno e sensibilizando a nossa opinião pública e os nossos governantes, consigamos construir um mundo onde o sofrimento e a miséria deixem de insultar a nossa consciência quantas vezes adormecida. Se assim não for, tornar-nos-emos em breve todos uns desumanos e o próprio conceito de Humanidade será posto em causa.

Sonho em construir um mundo melhor, onde os nossos filhos e netos possam viver em paz e harmonia, onde todos possam satisfazer as necessidades básicas vitais e onde a (re)distribuição da riqueza e do conhecimento seja mais equitativa, mais justa.

É pois com saudável esperança que observo, participo e incentivo o despertar da sociedade civil que quer a valorização do Homem como centro das estratégias e preocupações políticas. Esta orientação, fundamental para o futuro da Humanidade, é espontânea e mundial, e traduz-se na criação massiva de ONG (Organizações Não governamentais) em todos os países.

A emergência forte e global da sociedade civil organizada à volta de temas dominantes como a solidariedade, a participação, o combate à pobreza, a tolerância, a ecologia, os direitos humanos, o humanitário é quanto a mim a maior esperança, para não dizer única, de um mundo melhor para os nossos filhos.

Utopia? Penso sinceramente que não, ainda que não seja por Humanidade mas por  simples pragmatismo e sobrevivência da espécie. Estou convicto que os governos muitas vezes pressionados pelas suas sociedades civis cada vez mais informadas e exigentes (ainda bem!) vão ter que entender que mais importante que o mercado-rei é a política, mais importante que a política é o social, e que mais importante que o social são a moral e a ética humanas. Para a quadratura do círculo em que a minha geração está entalada não há outra alternativa. Só esta mudança radical de comportamento, de mentalidades e de visão nos conduzirá a um mundo melhor. Possam os governantes do mundo ter ousadia, rasgo, vontade política para que, como verdadeiros estadistas, deixem de viver a curto prazo ao sabor das ondas bolsistas e olhem para o infinito sem esquecerem o amanhã.

Temos todos um longo caminho a percorrer. Estou consciente que morrerei sem ter alcançado a meta tão desejada mas considero ainda assim que, todos juntos, temos obrigação de não desistir para que outros a venham a alcançar. É essa a nossa única obrigação como seres livres e humanos: tentar lá chegar sem esmorecer mesmo se perdidas algumas ilusões e alguns sonhos.

Continuarei a gritar a favor do Homem, a favor de África e contra o absurdo cinismo internacional que permite tanto sofrimento.

Fernando José de La Vieter Ribeiro Nobre
 ORIGEM

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