Este blog visa apenas dar visibilidade a textos de autores considerados de interesse para a compreensão da História Colonial de Angola. Por abarcar os mais diversas abordagens, é um blog dedicado aos de espirito aberto, que gostam de avaliar assuntos, levantar questões e tirar por si próprios suas conclusões. É natural que alguns assuntos venham a causar desagrado, e até reacções da parte daqueles cujas perspectivas estejam firmemente cristalizadas.
sábado, 13 de março de 2010
ASPECTOS DO TRAFICO DE ESCRAVOS DE ANGOLA PARA O BRASIL NO SÉCULO XVI
1. PROLEGÓMENOS DO INFERNO
Filipe Nunes de CARVALHO '
Herança da Antiguidade, a escravidão perdurou na Península Ibérica medieval. Com o início da expansão ultramarina portuguesa, no século XV, os mouros, que até então forneceram os efectivos, ao tempo já reduzidos, para o trabalho escravo vão sendo substituídos pêlos negros africanos. Em meados do século XVI cerca de dez por cento da população de Lisboa era já constituída por escravos1 e no Alentejo quinhentista o número de pessoas escravizadas correspondia a uns seis porcento do total de habitantes2.
Com o descobrimento do Brasil e a progressiva fixação dos portugueses nas suas terras, o recurso à escravização dos autóctones apresentou-se aos colonos carecidos de mão-de-obra como uma solução natural. A população ameríndia não era tão escassa como em tempos se supôs ou quis fazer crer. A dificuldade residia em submetê-la a um tipo de trabalho oposto aos seus hábitos ancestrais e à sua psicologia3. Beneficiando do acolhimento proporcionado pêlos sertões, onde o domínio português demorou a fazer-se sentir, os índios do Brasil ofereceram uma resistência que não deve ser negligenciada. A difusão
pêlos colonos de um discurso que enfatizava a bestialidade dos índios nem sempre se terá traduzido pêlos resultados pretendidos4. Os interesses dos missionários e as iniciativas legislativas da Coroa constituíram obstáculos suplementares, e nem sempre despiciendos, à redução dos autóctones ao cativeiro. Associados ao surto da economia sacarina, uns e outras conjugaram-se para favorecer o recurso sistemático à importação de negros africanos5. Além de pertencerem a civilizações tecnologicamente mais evoluídas que as
características dos naturais do Brasil, possuíam condições físicas e psicológicas para o trabalho duro e continuado nos engenhos e na mineração, a qual no século XVIII se tornaria a principal fonte de rendimento da América portuguesa. Por outro lado, os mesmos eclesiásticos católicos que se opunham à escravização dos índios mostravam-se coniventes com o cativeiro dos africanos e incentivavam a sua prática6.
Ainda no século XVI e durante toda a centúria seguinte desenvolve-se, em torno da produção sacarina, a estruturação da economia e da sociedade do Brasil. É, pois, o açúcar que constitui o principal estímulo para a importação de angolanos durante o período de que este trabalho se ocupa7. Dado que o território angolano não foi a única fonte de abastecimento de africanos ao Brasil, convém salientar que parece situar-se no século
XV11 a época de maior peso relativo da sua exportação humana8. Quando os portugueses chegaram a Angola a existência de indivíduos reduzidos à condição de escravos já era ali uma realidade, como sucedia em muitas regiões de África. O conhecimento das suas características suscitou especial interesse na fase assinalada pela tentativa de ocupação das, afinal inexistentes, minas de prata, um mito utilizado
para mobilizar homens e recursos que permitissem a colonização9. Os que mais contribuíram para o difundir, com destaque para os Jesuítas, tinham consciência da necessidade de se encontrarem alternativas reais para a exploração económica do território Continua....
http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3180.pdf.
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