segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A evolução económica de Angola durante o segundo período colonial — uma tentativa de síntese

Nuno Valério *  Maria Paula Fontoura*
Análise Social, vol. XXIX (129), 1994 (5.°), 1193-1208  

1. INTRODUÇÃO: O «SEGUNDO PERÍODO COLONIAL»

Quando, em 1876, os últimos escravos angolanos terminaram o período de
serviço que a Lei de 25 de Fevereiro de 1869 os obrigava a prestar aos seus antigos
senhores, Angola era constituída por quatro distritos (Zaire, Luanda, Benguela e
Moçâmedes), abrangendo uma área de cerca de 100 000 km2 na planície litoral e
um vago controle sobre entrepostos comerciais no interior. Cerca de 3000 pessoas
de origem europeia e quase meio milhão de indígenas habitavam este território,
cuja situação económica não era invejável, restringidas as exportações a bens
resultantes de actividades de predação, tais como o tradicional marfim ou a cera,
e à produção de algumas escassas plantações, principalmente de café.
Um século depois, quando, em 1975, Angola se tornou um Estado independente,
a situação era completamente diferente. O território alargara-se, sobretudo com o
controle dos planaltos do interior, até uma extensão de cerca de 1 247 000 km2.
A população de origem europeia aumentara até cerca de meio milhão e a população
de origem africana atingia perto de 6 milhões. A economia apresentava-se próspera,
quer devido à existência de exportações consideráveis de produtos agrícolas (café,
algodão, açúcar, sisal e outros provenientes de plantações; milho proveniente de
explorações tradicionais) e minerais (diamantes, ferro e petróleo) e mesmo de serviços
(particularmente através de trânsito para o Shaba, antigo Catanga, pelo caminho
de ferro de Benguela), quer devido ao início de um processo de industrialização.
Esta comunicação visa examinar as principais transformações da economia
angolana durante o século que mediou entre a abolição da escravatura e a independência, época que designaremos por «segundo período colonial». Com esta
designação pretendemos sublinhar os seus contrastes, por um lado, com o primeiro
período colonial, por outro, com o período da independência que se seguiu.
Durante o primeiro período colonial, o domínio europeu restringia-se à faixa
litoral e a parte da vida económica que ultrapassava os quadros do autoconsumoestava virada para o tráfico de escravos (destinados basicamente ao Brasil) e,
secundariamente, para a exportação de marfim. A abolição do tráfico de escravos
(legislada em 1837, mas só efectivada na década de 1850) rompeu o principal elo
comercial entre a colónia e a economia internacional.
No segundo período colonial verificou-se a construção de uma economia
nacional — condicionada pelos interesses económicos da metrópole e pelas oscilações
dos mercados externos — que serviu de suporte à abertura da economia
angolana ao exterior, sobretudo após a Primeira Guerra Mundial, e potencializou-
-se a viragem da estrutura produtiva na década e meia que antecedeu a independência
com a implantação de uma base produtiva dinâmica e diversificada.
Com a independência, o elo esssencial de ligação ao exterior da economia
angolana passou a ser o petróleo. A base produtiva anterior foi sendo destruída
e evoluiu para uma combinação de empresas públicas, mercados ilegais e economia
de autoconsumo.


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