Testemunho de Nuno Teotónio Pereira:1
"...Tenho aqui uma pequena resenha, que fiz há uns dois ou três anos, e agora actualizei, intitulada «Padres e Bispos que enfrentaram a Ditadura», acho que era um bom tema para um livro. São episódios que não são conhecidos da opinião pública, e tiveram enorme importância para a preparação do «25 de Abril» e para o fortalecimento das correntes que se opuseram à ditadura. Começo pelo:
padre Joaquim Alves Correia, missionário do Espírito Santo, que escreveu um livro que ficou na história, «A Largueza do Reino de Deus», e que também foi mandado para os Estados Unidos em 1946, onde veio a falecer em 51;
padre César Teixeira da Fonte, sacerdote madeirense expulso da sua terra por ter apoiado manifestações de protesto de camponeses explorados, veio residir para o continente, e foi um dos signatários destas cartas;
padre Manuel Rocha, originário dos Açores, Assistente da Acção Católica Operária, acusado pelo Governo de fomentar a revolta, e foi mandado pelo Cardeal Cerejeira, para Ludlow, Mass., como pastor de uma importante colónia açoriana [nos E.U.A.];
padre Abel Varzim, esse felizmente a acção dele é mais conhecida e há diversos livros sobre ele;
padre Adriano Botelho, pároco de Alcântara, enviado para a Patagónia, e nomeado depois pároco em São João de Brito, em Lisboa;
padre João Perestrelo de Vasconcelos, nomeado capelão do Arsenal do Alfeite, onde o pai tinha sido Administrador, por sinal um engenheiro de grande competência, que era conhecido do meu pai, pois moravam perto, na Estrela. O padre João Perestrelo de Vasconcelos, oriundo de famílias da alta burguesia, mas que no Arsenal do Alfeite, assume os problemas da classe operária, também subscritor destas cartas, esteve na Alemanha e no Brasil, e faleceu como todos sabemos há poucos dias;
padre António Jorge Martins, de que eu já falei, de quem recebi esta carta;
padre José da Costa Pio, coadjutor da Freguesia de Arroios, em Lisboa, que foi demitido e perseguido;
padre José Narino de Campos, pároco em Évora, acusado de inimigo da Pátria, e da Igreja, e que foi também mandado para o Brasil;
padre José Maria da Cruz Dinis, de Coimbra, de que não tenho grandes informações;
padre Joaquim Pinto de Andrade, de que já falei, Vigário Geral da Diocese de Luanda, deportado para Lisboa e transferido para a Ilha do Príncipe, foi preso oito vezes, porque acabava um período de prisão preventiva, e não sendo julgado, davam-lhe ordem de soltura, e era imediatamente preso à saída da prisão. Presidente Honorário do M.P.L.A. durante anos, faleceu fez agora há pouco tempo, um ano. A Viúva dele a Maria Vitória é que esteve agora há alguns meses em Portugal, e quando lhe falei desta sessão ela disse-me, “ai que pena, nesse dia, dia 3, é que eu vou regressar a Angola”, por isso não pode aqui estar;
padre Franklin da Costa, angolano, professor do Seminário de Luanda, foi logo a seguir ao 25 de Abril, e após a descolonização, nomeado Arcebispo de Lubango;
padre Alexandre Nascimento, também preso na mesma altura, deportado para Lisboa, com residência fixa, depois de regressado a Angola, foi Arcebispo de Luanda, e mais tarde Cardeal;
padre Manuel Joaquim das Neves, Vigário Geral de Luanda, acusado de preparar o assalto à prisão da PIDE, de 4 de Fevereiro, também deportado para Lisboa, para Braga, para uma casa Religiosa, onde morreu, e para não haver manifestações nem burburinho, o enterro dele em Braga, foi feito durante a noite;
padres Vicente Rafael, Domingos, Alfredo Gaspar, Martinho Bamba e Lino Guimarães, afinal eram mais do que os que eu já aqui enunciei, foram também presos em Luanda, a seguir ao 4 de Fevereiro, e também deportados para Portugal;
padre Mário de Oliveira, já bastante conhecido, nomeado capelão militar na Guiné, em 67, foi depois expulso, por indesejável, e nomeado pároco em Macieira da Lixa, no Norte, preso várias vezes pela PIDE;
padre José da Felicidade Alves, que é mais conhecido, também foi mandado pelo Cardeal Cerejeira, estudar para Paris, depois de ter feito umas homilias denunciando a Guerra Colonial, na Igreja dos Jerónimos, onde era pároco. Fundou os «Cadernos GEDOC» depois do seu regresso, «Grupo de Estudo e Documentação», que foram muito importantes, foi ele que organizou o livro Católicos e Politica – atrás citado;
e depois, padres holandeses [João Dekker e Adriano], alguns deles da Congregação dos Sagrados Corações, trabalhando na freguesia do Couço (Ribatejo), perto do Alentejo, onde houve muitas revoltas de camponeses, e eles solidarizaram-se com eles, [e ainda] o padre Bartolomeu Recker, que foram presos pela PIDE e levados para a fronteira de Badajoz;
padre Ismael Nabais Gonçalves, pároco da freguesia de Igreja Nova, em Mafra, preso em 1973; era uma das Igrejas onde eram policopiados documentos clandestinos; as paróquias tinham duplicadores a “stencil” e então, numerosos grupos usavam essas máquinas para fazer a edição dos documentos clandestinos.
Portanto, aqui está, não serão todos, mas estão aqui uns tantos padres que lutaram contra a ditadura, houve [também] Bispos, como se sabe, um deles, António Ferreira Gomes, Bispo do Porto, o Bispo da Beira, Sebastião Soares de Resende, o Bispo Manuel Vieira Pinto, de Nampula, que também, a certa altura, foi exilado para a Metrópole, foi mandado pela PIDE aqui para Portugal, pouco antes do 25 de Abril, o Bispo Altino Ribeiro de Santana13, também em Angola.
(...)
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