quinta-feira, 14 de julho de 2011

Literatura colonial portuguesa: Mário Mota - Angola, Eu Quero Falar Contigo



Mário Mota (1916-1981), Angola, Eu Quero Falar Contigo (1962).

Poeta e ensaísta, Mário Mota começou por publicar o conjunto de canções Traço-de-União e os poemas Retrato e Três Tábuas, de que se desconhecem as datas. Seguiram-se-lhes os volumes de poemas Dom Alentejo (1939), Os Troncos e as Raízes (1954), Gonga: Poemas de Angola (1962), Humanidade (1977), Poemas para Florbela d'Alma (1979) e Verdura:Poemas a Sintra (1979).

O presente volume anuncia a publicação do livro de poemas Dança Negra, da colectânea Vida Poética e do conjunto de contos Estrada de Catete, mas não se encontram registos da publicação dessas obras sob estes títulos. É muito provável, no entanto, que Dança Negra corresponda ao livro Gonga: Poemas de Angola, pois o subtítulo é comum.

Na senda do que já tinha sido feito por outros autores, durante as décadas de 1930 e 1940, na revista O Mundo Português, Mário Mota publicou também como separata da revista Gil Vicente o seu contributo para uma lista da literatura colonial, intitulado Uma Bibliografia de Literatura Ultramarina (1969).

Seguindo embora uma carreira na aeronáutica civil, o autor colaborou na imprensa e na rádio, particularmente em Angola. O seu poema mais conhecido, A Palavra, foi traduzido em várias línguas e incluído nas antologias Phalanstere de la Poesie (Bélgica) e International Anthology (Reino Unido).

Do presente volume transcrevem-se o poema O Menino e um excerto de um poema evocativo do escritor são-tomense Costa Alegre (1864-1890; cf. http://literaturacolonialportuguesa.blogs.sapo.pt/7316.html):

O MENINO

   A preta lavadeira já é mãe
   e a sua primeira preocupação
   foi mostrar o seu menino preto
   ao patrão
   e à senhora do patrão...

   O seu homem veio também.

   Ela vestiu panos estampados, novos, era mãe,
   Ele trazia o menino ao colo, aconchegado.

   Vinham contentes, ela gesticulando.

   Por fim chegaram.

   E discutiram entre os dois qual o primeiro a falar.

   E sorriram para o seu menino preto.
   Abriu a porta  a senhora do patrão.

   E os dois apenas disseram:

   O menino!

   Estava feita a apresentação.




COSTA ALEGRE

   (...)

   O poeta era negro
   e tinha pena de ser negro
   este poeta negro de São Tomé!

   Mas só a sua pele luzidia
   era negra,
   escura,
   sombria como o negrume da noite.
   Tudo o mais se expandia
   e refulgia no poeta em grandeza
   numa indiferença pela cor

   (...)

   Que tinha que fosse negra a sua cor
   e luzidia  sua pele?

   Não era a sua poesia de frescor
   não era cristalina a sua ansiedade?

   Porque odiaria o poeta a sua cor?

   Que tem que ver a cor
   de cada um
   se é igualmente humano
   o seu amor
   e igual a mesma dor
   seja qual for a cor?

   (...)
In © Blog da Rua Nove

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